Imagine você trabalhando em um café simples, quando de repente sua vida se transforma completamente ao conhecer alguém que mudará tudo. Uma história de amor impossível, preconceitos, família e a coragem de lutar pelos seus sonhos. Você já se perguntou se o amor verdadeiro pode vencer qualquer barreira. De onde você está assistindo esse vídeo? Conta aqui nos comentários.
E não esquece de se inscrever no canal e deixar aquele like maroto para fortalecer. Agora vamos à história. O aroma de café expresso pairava pelo ar do café imperial, localizado na elegante rua da Bahia, no coração de Belo Horizonte. Maria Guimarães ajustou o avental branco sobre o uniforme preto, observando através da vidraça os executivos que passavam apressados pela calçada.
Aos 19 anos, ela conhecia cada detalhe daquele ambiente requintado, as xícaras de porcelana importada, as mesas de mogno lustradas, os quadros abstratos nas paredes creme. Mesa cinco expresso, duplo sem açúcar, murmurou para si mesma, equilibrando a bandeja prateada enquanto caminhava entre as mesas ocupadas por homens de terno e mulheres de salto alto.
Era sua terceira semana servindo naquela mesa específica, sempre para o mesmo cliente. João Andrade ergueu os olhos do notebook quando ela se aproximou. 40 anos, cabelos castanhos com fios grisalhos nas têmporas, olhos verde acinzentados que carregavam uma melancolia profunda.
O terno azul marinho, impecavelmente cortado, custava mais do que Maria ganhava em três meses. “Obrigado”, disse ele, a voz grave ecoando uma educação refinada. Maria assentiu e se afastou, mas algo a fez olhar por sobre o ombro. João não tocara no café, simplesmente contemplava a janela, os dedos tamborilar nervosos sobre a mesa.
A expressão em seu rosto era de alguém perdido, mesmo estando em território familiar. Três mesas adiante, o celular de Maria vibrou discretamente. Uma mensagem da avó Rosa. Neta, preciso falar contigo sobre os remédios. Tá faltando da pressão. O coração de Maria apertou. Dona Rosa, aos 70 anos, era tudo que lhe restava no mundo.
Moravam juntas no bairro Barreiro, numa casa simples que abrigava duas gerações de sonhos adiados. Maria trabalhava desde os 17 para custear os medicamentos da avó e ainda sonhava secretamente em estudar psicologia. Com licença, Maria quase derrubou a bandeira vazia ao ouvir a voz atrás de si. João estava de pé ao lado da mesa dela, as mãos enterradas nos bolsos da calça. Sim, senhor.
Você você já se sentiu perdida, mesmo estando onde deveria estar? A pergunta apegou desprevenida. Maria piscou, estudando aquele homem que frequentava o café há semanas em silêncio absoluto. Havia algo genuíno em seus olhos, uma vulnerabilidade que contrastava com a postura empresarial.
Todo dia”, respondeu ela, honesta demais para sua própria segurança. João pareceu surpreso com a franqueza da resposta. Um meio sorriso tocou seus lábios. Imaginei que fosse o caso. Você tem um olhar diferente, como se estivesse sempre pensando em outro lugar. Maria sentiu o rosto esquentar. Tenho que trabalhar, senhor João. Meu nome é João.
Ele estendeu a mão e o seu? A mão dele era quente, macia demais para alguém que trabalhasse de verdade. Maria hesitou antes de responder. Maria, Maria. Ele repetiu seu nome como se estivesse testando o sabor. Posso perguntar o que você estava pensando quando me serviu o café? A honestidade continuou fluindo antes que ela pudesse se conter. que você parece mais perdido do que eu.
O sorriso de João se alargou e, pela primeira vez, desde que começara a frequentar o café, seus olhos brilharam com algo parecido com alegria. Tem razão, completamente perdido. O gerente do café, Senr. Eduardo, apareceu como um fantasma atrás do balcão, os olhos fixos na interação entre eles.
Maria sabia que precisava se afastar, mas algo na presença de João a hipnotizava. Talvez, disse João abaixando a voz, possamos nos perder juntos alguma vez. Que tal um café em outro lugar, longe daqui? Maria sentiu o mundo tremer sob seus pés. Um homem como aquele, convidando-a para sair, tinha que haver um mal entendido. Eu não sei se seria apropriado, Senr.
João, por que não? As palavras saíram antes que ela pudesse se censurar. Porque você está usando sapatos que custam mais do que minha avó recebe de aposentadoria em seis meses. João riu, uma gargalhada genuína que ecoou pelo café e atraiu olhares curiosos de outros clientes. Maria sentiu o rosto queimar de vergonha. Desculpa, eu não deveria ter não. Interrompeu ele ainda sorrindo.
Foi perfeito. Exatamente o que eu precisava ouvir. Maria não sabia o que responder. João tirou um cartão de visita do bolso interno do palitó e o colocou sobre a mesa. Meu telefone está aí. Se mudar de ideias sobre o café ou sobre se perder comigo. Ele deixou duas notas de R$ 50 sobre a mesa, mais de 10 vezes o valor do expresso, e se dirigiu à porta.
Na saída virou-se uma última vez. Ah, Maria, para sua informação, estes sapatos foram um presente de casamento. Minha ex-mulher os escolheu. Uso eles para lembrar dos erros que não pretendo repetir. A porta se fechou atrás dele, deixando Maria sozinha com o cartão de visita entre os dedos trêmulos e uma pergunta ecoando em sua mente.
Que tipo de homem confessa seus erros para uma estranha e deixa gorgeta suficiente para comprar remédios para uma semana inteira? Duas semanas se passaram desde o encontro no café imperial e Maria não conseguira tirar João Andrade da cabeça. O cartão de visita permanecia escondido entre as páginas de um livro de psicologia usado que comprara num CEO na rua Caetés.
João Andrade, CEO, Grupo Andrade Empresarial, dizia em letras douradas sobre papel creme. “Neta, você anda estranha”, observou dona Rosa enquanto descascava batatas na cozinha apertada de suas casas no Barreiro. “Fica aí suspirando, olhando pro nada”. Maria fingiu concentração extrema na tarefa de dobrar roupas. “Não é nada, vó. Só trabalho. Trabalho uma pinoia.
” Rosa parou o que estava fazendo e fixou os olhos espertos na neta. Tá escondendo alguma coisa de mim, menina. E eu que criei você desde pequeninha, não vou saber quando você tá com algum homem na cabeça. O rosto de Maria queimou. Às vezes odiava como sua avó era perspicaz. Não tem homem nenhum vó. Ah, tem sim. E pelo jeito que você tá, deve ser homem de fora do nosso círculo.
Rosa retomou o descasque das batatas, mas manteve o tom investigativo. É aquele menino do mercado, o Carlinhos, que sempre dá em cima de você? Não. A resposta saiu rápida demais, confirmando as suspeitas de rosa. Então é alguém que não conheço. A avó assentiu para si mesma. Maria, senta aqui comigo relutante. Maria se acomodou na cadeira de madeira ao lado da mesa da cozinha.
Rosa segurou suas mãos com os dedos ásperos de quem trabalhou a vida inteira. Filha, você é uma menina inteligente, bonita, trabalhadora. Qualquer homem de bem ficaria feliz em ter você do lado dele. Mas Rosa fez uma pausa significativa. Cuidado para não se iludir com coisas que não são para a gente.
O que você quer dizer com isso? que às vezes a gente conhece gente de outro mundo e acha que pode fazer parte dele, mas a realidade é cruel, neta. Gente rica não se mistura com gente pobre, pode até brincar um pouco, mas na hora do aperto eles sempre voltam para o lado deles. As palavras da avó ecoaram na mente de Maria durante todo o caminho para o trabalho. Talvez Rosa estivesse certa.
Talvez ela estivesse fantasiando algo impossível com um homem que estava apenas sendo educado. O café imperial estava mais movimentado que o normal quando ela chegou. Reunião de negócios! Explicou o Senr. Eduardo, ajustando a gravata nervosamente. Tem uns empresários importantes vindo aí. Você fica responsável pela mesa deles, Maria.
E pelo amor de Deus, não faz bobagem. Maria assentiu e se concentrou em organizar as xícaras de porcelana quando ouviu uma voz familiar conversando perto da entrada. Então precisa fechar o contrato ainda hoje. Os investidores estão impacientes. Era João. Maria se escondeu atrás da máquina de café expresso, observando o cumprimentar dois homens de meia idade.
Ele usava um terno cinza que destacava ainda mais os olhos esverdeados e carregava uma pasta de couro que provavelmente custava mais que o aluguel de sua casa. Mesa do fundo, cavalheiros dirigiu Eduardo com excessiva reverência na voz. Maria respirou fundo e se aproximou com a bandeja, as mãos tremendo imperceptivelmente. Quando João a viu, seu rosto se iluminou com um sorriso genuíno.
Maria, que surpresa boa. Os outros dois homens a olharam de cima a baixo. Um exame que a fez se sentir como um inseto sob lupa. Um deles, careca com óculos dourados, rio baixinho. João, não sabia que você conhecia a equipe local. A forma como ele disse equipe local fez o estômago de Maria se revirar.
João percebeu o desconforto dela e sua expressão se endureceu ligeiramente. Maria é uma pessoa muito inteligente, Roberto. Vocês poderiam aprender algumas coisas com ela. Roberto Maria lembrou vagamente de João mencionar um irmão mais velho. O outro homem mais novo e com um sorriso arrogante se inclinou na cadeira. Inteligente como exatamente? Ela fez algum curso superior? tem experiência empresarial.
O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Maria sentiu suas bochechas pegarem fogo. João abriu a boca para responder, mas ela se antecipou. Não tenho curso superior, não. Mal terminei o ensino médio porque precisava trabalhar para cuidar da minha avó, mas sei a diferença entre educação e grosseria, o que, pelo visto, nem todo mundo com diploma consegue aprender.
A resposta surpreendeu a todos, incluindo a própria Maria. O homem mais novo pareceu ofendido, mas Roberto riu abertamente. Essa tem personalidade. Gostei dela, João. Maria. João se levantou, ignorando os olhares dos companheiros. Posso falar com você um momento? Em particular, ela o seguiu até um canto mais reservado do café, o coração batendo descompassado. João parecia lutar com as palavras.
Desculpa por aquilo ali. Meu irmão Roberto e o sócio dele, Marcelo, são difíceis. Eles não estão errados. Maria murmurou. Eu realmente não tenho estudo. Não tenho experiência em para João tocou seu braço gentilmente. Você tem algo que a maioria das pessoas que conheço não tem. Coragem de falar a verdade. E isso vale mais que qualquer diploma.
Maria olhou nos olhos dele e viu sinceridade, mas também viu algo mais. Interesse genuíno, um interesse que a assustava tanto quanto a emocionava. Por que você está sendo gentil comigo? Porque você me faz lembrar de quem eu era antes de me perder nesse mundo? João parou como se tivesse revelado mais do que pretendia.
Maria, você toparia jantar comigo? Não em lugar chique, não como executivo e garçonete, só como João e Maria. Ela queria dizer sim mais do que qualquer coisa. Mas as palavras de dona Rosa ecoaram em sua mente. Gente rica não se mistura com gente pobre. Eu preciso pensar. Claro. João sorriu, mas havia decepção em seus olhos. Minha proposta continua de pé.
Ele voltou para a mesa, deixando Maria com o coração partido entre duas verdades impossíveis. a certeza de que estava se apaixonando por ele e a certeza de que nunca poderia dar certo. Do outro lado do café, Roberto observava a interação entre eles com interesse renovado. E pela primeira vez, Maria sentiu como se alguém a estivesse avaliando por razões que não conseguia compreender completamente.
Era quase meia-noite quando Maria finalmente pegou o telefone. Dona Rosa dormia há horas, os remédios fazendo efeito depois de um dia difícil em que a pressão subira perigosamente. Maria havia passado as últimas 4 horas andando pela casa, o cartão de João numa mão e o celular na outra.
A voz dele atendeu no segundo toque. Alô, João? Sou eu, Maria. Um silêncio seguido de um suspiro de alívio. Que bom você ligar. Não consegui parar de pensar no que aconteceu hoje. Eu Eu queria me desculpar. Não deveria ter falado daquela forma com seus colegas. Desculpar? A voz de João soou genuinamente surpresa. Maria, você foi perfeita.
Disse exatamente o que eu queria ter coragem de falar. Ela se acomodou na cadeira da cozinha, enrolando o fio do telefone fixo entre os dedos. Mesmo assim, foi constrangedor. Para você também. Quer saber de uma coisa? foi libertador. João fez uma pausa. Posso te contar algo que nunca contei para ninguém? O coração de Maria acelerou. Pode.
Eu odeio essa vida. Odeio as reuniões, os ternos caros, as conversas vazias sobre dinheiro. Herdei tudo isso do meu pai quando tinha 28 anos. E desde então sinto como se estivesse vivendo a vida de outra pessoa. Maria fechou os olhos absorvendo cada palavra. E por que não muda? Porque é fácil falar, difícil fazer.
Você tem ideia de quantas pessoas dependem do que eu faço? Quantos empregos? Quantas famílias? João suspirou pesadamente. E tem meu irmão Roberto. Ele sempre achou que deveria ter herdado a empresa no lugar de mim. Qualquer sinal de fraqueza e E ele toma seu lugar. Exato.
Maria mordeu o lábio inferior, pensando nas palavras seguintes: “Posso te contar algo também?” Claro, eu sonho em estudar psicologia, quero ajudar pessoas, entende? Mas toda vez que vejo o tanto de dinheiro que preciso para uma faculdade, parece tão impossível que chega a doer. Por que psicologia? A pergunta era simples, mas a resposta era complexa. Maria respirou fundo porque cresci cuidando da minha avó, ouvindo as histórias dela sobre perdas, dores, sonhos que ficaram pelo caminho.
E percebi que às vezes a gente só precisa de alguém que escute de verdade, que entenda. Quero ser essa pessoa e você seria incrível nisso. A certeza na voz dele a surpreendeu. Como pode ter tanta certeza? Porque você me escutou hoje de verdade, faz tempo que ninguém faz isso. Um silêncio confortável se estabeleceu entre eles. Maria podia ouvir a respiração de João através da linha e de alguma forma isso a acalmava. João? Sim.
Sobre o jantar. Eu aceito. Ela quase podia sentir o sorriso dele através do telefone. Sério mesmo? Mas tem uma condição. Qual? Nada de lugares chiques. Quero ir em algum lugar onde você se sinta como João, não como CEO da empresa. Uma risada baixa ecoou pelo telefone. Conheço o lugar perfeito.
Dois dias depois, Maria se olhava no espelho do quarto pequeno que dividia com as lembranças da avó. O vestido amarelo que usava era o mais bonito que possuía. Comprado numa liquidação dois anos antes, mas bem conservado. Dona Rosa apareceu na porta apoiando-se na bengala. Tá linda, neta. Obrigada, avó. E nervosa. Maria riu nervosamente um pouco. Rosa se aproximou e ajustou uma mecha rebelde do cabelo da neta.
Esse João, ele é bom homem? Acho que sim. Acho não é a resposta, Maria. Você sente que ele é? Maria pensou na conversa telefônica, na vulnerabilidade na voz de João, na forma como ele a havia defendido no café. Sinto que sim. Então vai. Mas com cuidado, tá? Rosa segurou seu rosto com as mãos. E lembra, você vale tanto quanto qualquer pessoa nesse mundo. Não deixa ninguém te fazer pensar o contrário.
Quando João chegou para buscá-la, dirigindo um carro simples ao invés da BMW que costumava usar, Maria soube que havia feito a escolha certa. Ele usava jeans e uma camisa azul clara e parecia mais relaxado do que jamais o vira. “Você está linda”, disse ele descendo para abrir a porta do passageiro. “Obrigada. E você está diferente. Diferente como mais você. João sorriu enquanto ligava o carro.
É exatamente assim que quero estar hoje. O restaurante que ele escolheu era uma churrascaria simples na Savace, longe dos ambientes sofisticados que ele frequentava. Sentados numa mesa de fórmica vermelha, dividindo uma porção de contrafilé com batata frita, eles conversaram como se fossem velhos amigos.
Conta uma coisa sobre você que ninguém sabe”, pediu Maria roubando uma batata do prato dele. “Eu escrevo poemas”, confessou João corando ligeiramente. “Sério, ruins?” “Mas escrevo. E você?” Maria hesitou antes de responder. Eu nunca nunca namorei ninguém, de verdade. João parou de mastigar. “Como assim? Nunca tive tempo. Nunca me interessei por ninguém do meu bairro? Nunca?” Ela corou intensamente.
É patético. Eu sei. Não é patético. João estendeu a mão sobre a mesa, tocando-a dela. É especial. Especial porque significa que eu não sei nada sobre relacionamentos. Especial porque significa que você guardou seu coração para quem realmente valesse a pena. Maria sentiu lágrimas se formarem nos olhos.
Nenhum homem jamais falara com ela daquele jeito. João, você tem certeza do que está fazendo comigo? digo. Ele apertou sua mão com mais força. Pela primeira vez em anos, tenho certeza absoluta de alguma coisa. Quando ele a trouxe de volta para casa, Maria sabia que estava perdidamente apaixonada.
E, pelo brilho nos olhos de João quando ele se despediu com um beijo no rosto, soube que não estava sozinha nesse sentimento, mas observando pela janela da sala, enquanto ele se afastava, não pôde evitar a sensação de que algo estava prestes a complicar aquela felicidade perfeita. A semana que se seguiu ao primeiro encontro passou como um sonho. João aparecia no café imperial todos os dias, não mais como o empresário solitário contemplando a janela, mas como um homem apaixonado que mal conseguia tirar os olhos de Maria. Eles trocavam olhares cúmplices entre os pedidos, sussurros rápidos quando ela
servia seu café, pequenos bilhetes deixados discretamente na mesa. “Você está radiante”, comentou Lúcia, a colega de trabalho mais próxima de Maria. enquanto organizavam as xícaras no fim do expediente. Tem alguma coisa a ver com aquele empresário bonitão que não para de vir aqui? Maria tentou disfarçar o sorriso que insistia em aparecer.
Não sei do que você está falando. Ah, sei. Ela não sabe. Lúcia riu. Maria, todo mundo já percebeu. Até o Senr. Eduardo anda desconfiado, como se tivesse sido invocado. Eduardo apareceu atrás do balcão, a testa franzida de preocupação. Maria, preciso falar com você. No pequeno escritório nos fundos do café, Eduardo se acomodou atrás da mesa atulhada de papéis e encarou Maria com seriedade.
Olha, menina, você é uma boa funcionária, pontual, dedicada, educada com os clientes. Mas, mas esse envolvimento com o Senr. Andrade está me preocupando. Eduardo tirou os óculos e os limpou nervosamente. Homens como ele não se envolvem seriamente com pessoas como como a gente. As palavras ecoaram as de dona Rosa, fazendo o estômago de Maria revirar. Eduardo, nada está acontecendo de errado. Somos apenas amigos. É isso? Eduardo a interrompeu.
Maria, eu não nasci. Vejo como vocês se olham, como ele sorri quando você se aproxima. E vejo também como os outros clientes estão comentando. Comentando o quê? que a garçonete do imperial está se achando porque um empresário rico está dando corda para ela. Eduardo suspirou pesadamente.
Não quero que você se machuque, menina, mas também não posso permitir que isso afete a reputação do estabelecimento. Maria sentiu o mundo tremer sob. Você está me demitindo? Estou te orientando. Mantenha a distância profissional ou vou ter que tomar medidas mais drásticas. Naquela noite, Maria chegou em casa mais tarde que o normal. O coração pesado com as palavras de Eduardo.
Dona Rosa a esperava na sala, tricotando um cachecol laranja enquanto assistia a novela. Como foi o trabalho, neta? Normal. Mentiu Maria, beijando a testa da avó antes de se dirigir ao quarto. Maria. A voz de Rosa, a deteve. Senta aqui comigo um minutinho. Relutante, Maria se acomodou ao lado da avó no sofá poído.
Rosa desligou a televisão e se virou para ela. O que está acontecendo com você e esse homem? A pergunta direta pegou Maria desprevenida. Vó, eu a vizinha Cleusa me contou que te viu entrando num carro bonito na semana passada e a Conceição disse que você anda diferente, mais arrumada, mais sorridente. Rosa segurou as mãos da neta. Não me esconde as coisas, filha. Maria respirou fundo e contou tudo.
O primeiro encontro, as conversas, o jantar, os sentimentos que cresciam a cada dia. Rosa escutou em silêncio, o rosto cada vez mais preocupado. Maria, você tem certeza de que esse homem tem intenções sérias? Tenho, vó. Ele é diferente do que eu pensava. Diferente como ele é gentil, me escuta de verdade, me faz sentir especial.
Maria parou, procurando as palavras certas. Quando estou com ele, sinto como se como se eu pudesse ser mais do que só uma garçonete. Rosa suspirou profundamente. Neta, você já é mais do que uma garçonete. É uma moça inteligente, carinhosa, trabalhadora, não precisa de homem nenhum para te completar. Eu sei, vó, mas com ele eu sinto que posso sonhar mais alto.
E se ele cansar da brincadeira? E se a família dele não aceitar? E se E se der certo? Maria interrompeu, os olhos brilhando com determinação. E se ele realmente me amar e eu a ele não tenho direito de tentar ser feliz? Rosa olhou longamente para a neta, vendo nela a mesma teimosia que ela própria havia tido na juventude.
Tem direito, sim, mas promete que vai com cuidado, que não vai esquecer quem você é, nem de onde veio. Prometo. No dia seguinte, João chegou ao café mais cedo que o habitual. Maria percebeu imediatamente que algo estava diferente. Ele parecia tenso, inquieto, olhando constantemente para o celular. Tudo bem? Perguntou ela ao servir seu expresso.
Podemos conversar depois do seu expediente? É importante. O tom sério na voz dele a alarmou. Claro. As horas se arrastaram lentamente até o final do turno. Maria encontrou João esperando na calçada em frente ao café, as mãos enterradas nos bolsos da calça. “Vamos caminhar”, sugeriu ele. Eles desceram a rua da Bahia em direção ao centro, o silêncio inicial carregado de tensão.
Finalmente, João parou em frente à igreja do Rosário. “Maria, preciso te contar uma coisa.” O coração dela disparou. O quê? Meu irmão Roberto descobriu sobre nós. Como assim descobriu? João passou a mão pelos cabelos, um gesto que ela já aprendera a reconhecer como sinal de nervosismo extremo. Ele tem pessoas que o informo que faço. Aparentemente alguém nos viu no restaurante, tirou fotos. Maria sentiu o sangue gelar.
E daí? Não estávamos fazendo nada de errado. Para ele estou. Roberto acha que qualquer relacionamento pode ser usado contra mim nos negócios. E João hesitou. Ele não aprova você. Ele nem me conhece direito. Não precisa. Para ele basta saber que você não tem o pedigri certo para a família Andrade.
As palavras doerem mais do que Maria esperava. E você, o que pensa sobre isso? João se virou para ela, os olhos verdes intensos. Penso que nunca me importei menos com a opinião do meu irmão. Ele segurou as mãos dela. Maria, estou apaixonado por você. Perdidamente, completamente apaixonado.
O coração de Maria saltou, mas uma parte dela permaneceu cautelosa. E o que isso significa para nós? Significa que vou lutar por isso, por nós. João trouxe as mãos dela aos lábios, beijando cada dedo delicadamente. Mas preciso que você saiba que não vai ser fácil. Roberto vai tentar nos separar. Meus sócios vão questionar minha decisão. A alta sociedade mineira vai nos julgar.
Maria olhou nos olhos dele, procurando qualquer sinal de dúvida. Não encontrou nenhum. Você tem certeza de que vale a pena? Todo esse problema por causa de uma garçonete do Barreiro? João segurou seu rosto com as duas mãos. Vale a pena por causa de você, Maria. Não importa de onde você venha ou o que faz da vida, importa quem você é. Ele a beijou então ali em frente à igreja histórica, um beijo que selou o destino de ambos.
Maria se entregou completamente àquele momento, sabendo que estava cruzando uma linha da qual não haveria volta. Quando se separaram, ela sabia que havia tomado a decisão mais importante de sua vida. E pelo olhar determinado de João, soube que ele também, mas nenhum dos dois conseguia imaginar o tamanho dos obstáculos que Roberto Andrade estava preparando para destruir aquele amor.
Roberto Andrade não era homem de meias palavras ou estratégias sutis. Três dias após descobrir o relacionamento do irmão, ele apareceu no café imperial durante o horário de maior movimento, alto, impecavelmente vestido e carregando uma aura de autoridade que fazia as pessoas automaticamente se curvarem. Ele varreu o ambiente com os olhos até localizar Maria.
“Você deve ser Maria Guimarães”, disse ele, aproximando-se do balcão onde ela organizava xícaras. O tom não era exatamente hostil, mas tampouco amigável. Maria ergueu os olhos e reconheceu imediatamente os traços familiares, a mesma linha forte do maxilar de João, os mesmos olhos verdes. Mas onde João carregava gentileza, Roberto emanava frieza calculista.
Sim, sou eu. Posso ajudá-lo? Gostaria de conversar com você em particular. Roberto olhou ao redor do café movimentado. Há algum lugar onde possamos ter privacidade? Maria hesitou. Senr. Eduardo observava a interação do outro lado do salão, claramente reconhecendo Roberto como alguém importante. Ela não podia simplesmente recusar. Há uma sala de reuniões pequena nos fundos.
Se me der licença por alguns minutos. Roberto assentiu e a seguiu através do café. Maria sentia os olhares curiosos de clientes e funcionários queimando suas costas. Na sala apertada, com apenas uma mesa e duas cadeiras, Roberto fechou a porta atrás de si. Então você é a razão pela qual meu irmão anda tão distraído ultimamente.
Maria manteve a postura ereta, lembrando-se das palavras de dona Rosa sobre nunca se diminuir diante de ninguém. Se o senhor está se referindo ao nosso relacionamento. Sim, relacionamento. Roberto repetiu a palavra como se testasse um sabor desagradável. Interessante escolha de termo. É o que é, senor Andrade Roberto.
E me diga, Maria, você tem ideia do que está fazendo com a vida do meu irmão? A pergunta apegou desprevenida. Como assim? Roberto se acomodou na cadeira com a elegância natural de quem estava acostumado a comandar qualquer ambiente. João é um romântico incorrigível, sempre foi. Acredita em amor verdadeiro, em finais felizes de filme americano. Ele fez uma pausa estudando a reação dela.
Mas a realidade dos negócios é mais cruel. Não estou seguindo seu raciocínio. Simples. A posição de João como CEO do grupo Andrade não depende apenas da competência dele. Embora ele seja extremamente competente. Depende também da imagem que projeta, das alianças que forma, da confiança que inspira nos investidores.
Maria sentiu um arrepio de apreensão, mas manteve a voz firme. E o que isso tem a ver comigo? Tudo. Roberto se inclinou para a frente. Os acionistas majoritários são famílias tradicionais mineiras, gente conservadora que valoriza certos padrões. Um CEO solteiro é aceitável. Um CEO com uma esposa da alta sociedade é ideal, mas um CEO envolvido com uma, ele fez uma pausa calculada, uma garçonete de classe baixa, isso levanta questões sobre seu julgamento. As palavras doeram, mas forçou-se a não demonstrar.
João é um homem adulto, pode tomar suas próprias decisões. Pode sim, e eu respeito isso. Mas você também é uma mulher adulta, inteligente, pelo que percebo, deve entender as implicações. Que implicações? Roberto abriu a pasta que trouxera e retirou uma série de documentos. O grupo Andrade está negociando uma fusão com a mineração Santa Bárbara, um negócio de 200 milhões de reais que garantiria nossa posição como líder no setor de mineração em Minas Gerais. Ele deslizou uma foto sobre a mesa. Maria viu João
cumprimentando um homem de meia idade em um ambiente corporativo. Este é Coronel Figueiredo, presidente da Santa Bárbara, militar reformado, católico devoto, daqueles que acreditam que cada um deve ficar em seu lugar. Roberto tocou a foto com o dedo. Semana passada ele me procurou para uma conversa informal sobre os hábitos pessoais de João.
Aparentemente chegaram boatos ao conhecimento dele. O estômago de Maria revirou. Que tipo de boatos? Que o CEO do grupo Andrade está envolvido com alguém inadequado para sua posição social. Roberto guardou a foto. Figueiredo me deixou claro que a fusão poderia ser reconsiderada se João não demonstrasse mais responsabilidade em suas escolhas pessoais. Maria ficou em silêncio por um longo momento, absorvendo as implicações.
Finalmente encontrou a voz: “O senhor está me chantagear? Estou te oferecendo informação para que tome uma decisão consciente.” Roberto tirou um envelope do bolso interno do palitó. João construiu esse império durante 12 anos. Milhares de famílias dependem dos empregos que ele gera. Uma decisão emocional dele pode destruir tudo isso.
E a decisão emocional que o Senhor quer que eu tome, que termine o relacionamento de forma definitiva, Roberto colocou o envelope sobre a mesa em troca a R$ 50.000 aí dentro. Suficiente para você pagar uma faculdade particular, cuidar da sua avó, começar uma nova vida. Maria olhou para o envelope como se ele fosse uma cobra venenosa. O senhor acha que eu estou com João por dinheiro.
Não preciso saber suas motivações. Preciso apenas de uma solução para um problema empresarial. Eu não sou um problema empresarial. Sou uma pessoa que se apaixonou e foi correspondida. Roberto suspirou como se lidasse com uma criança teimosa. Maria, vou ser brutalmente honesto com você. Mesmo que esse romance continue, mesmo que vocês se casem, você nunca será aceita no mundo dele.
Vai ser sempre a ex-garonete que subiu na vida. Seus filhos carregarão essa marca. E João, João vai acabar ressentindo você por tudo que perdeu por sua causa. As palavras atingiram Maria como socos no estômago. Roberto continuou implacavelmente. Você o ama de verdade? Então prove. Deixe-o livre para ser quem ele precisa ser.
Aceite o dinheiro, some da vida dele, permita que ele encontre alguém apropriado. Maria se levantou, as pernas tremendo. Preciso pensar, claro, mas não demore muito. Roberto se levantou também, pegando a pasta. A reunião com Figueiredo é na próxima semana. E Maria? Uma coisa que aprendi nos negócios. Oportunidades como essa não aparecem duas vezes.
Ele deixou o envelope sobre a mesa e saiu da sala, deixando Maria sozinha, com o peso de uma decisão que poderia destruir ou salvar o homem que amava. Do lado de fora, sem que Maria soubesse, Senr. Eduardo havia escutado parte da conversa através da porta fina, e em sua mente as peças de um plano se formavam, um plano que mudaria tudo. Maria passou a noite inteira acordada.
O envelope de Roberto sobre a mesa da cozinha como uma acusação silenciosa. Dona Rosa havia se recolhido cedo, mas Maria podia ouvir os movimentos inquietos da avó no quarto ao lado, um sinal de que ela também não conseguia dormir. Às 6 da manhã, Rosa apareceu na cozinha de camisola e chinelos, encontrando Maria, ainda sentada na mesma posição, olhando fixamente para o envelope lacrado.
Neta, você não veio dormir? Não consegui. Rosa preparou café no fogão antigo, o ritual matinal trazendo alguma normalidade àquele momento surrealista. Ela colocou duas xícaras sobre a mesa e se sentou ao lado da neta. Que papel é esse? Maria hesitou, mas decidiu contar tudo. Cada palavra de Roberto, cada ameaça disfarçada, cada argumento cruel, mas logicamente irrefutável.
Rosa escutou em silêncio, ocasionalmente balançando a cabeça. R$ 50.000, murmurou quando Maria terminou de falar. É muito dinheiro, vó. É mesmo? Rosa tomou um gole do café amargo. Daria para pagar seu curso na particular meus remédios. Talvez até uma casinha melhor. Então você acha que eu deveria? Não? A resposta foi firme e imediata. Não acho nada disso. Maria olhou surpresa para a avó.
Mas você sempre disse que nossa vida era aqui, que não devíamos sonhar além da nossa condição. E estava errada. Rosa segurou as mãos da neta. Maria, criei você depois que seus pais morreram naquele acidente. Você tinha 5 anos, lembra? Maria assentiu a garganta apertando com as memórias.
Prometi para sua mãe no leito do hospital que faria você ser forte, que não deixaria ninguém pisotear você. E durante todos esses anos, achei que isso significava ensinar você a ficar no seu lugar. Rosa balançou a cabeça. Mas ontem, vendo você contar sobre esse homem, vi nos seus olhos uma luz que não via desde que você era criança. Vi esperança de verdade.
Mas e se Roberto estiver certo? E se eu só trouxer problemas para João? E se trouxer felicidade? E se o amor de vocês for mais forte que as besteiras que a sociedade inventa? Rosa apertou as mãos da neta. Filha, dinheiro a gente consegue de outras maneiras. Amor verdadeiro, isso é raro.
Duas horas depois, Maria estava no café imperial, servindo os clientes matinais com movimentos automáticos, enquanto sua mente fervia com dúvidas. João não havia aparecido ainda. Normalmente chegava às 9 em ponto. Maria, Sr. Eduardo, se aproximou, a expressão mais séria que ela já vira. Preciso falar com você.
No meu escritório, no cubículo apertado que servia de escritório, Eduardo fechou a porta e se virou para ela com o rosto carregado. Ontem eu ouvi parte da conversa que você teve com o irmão do Senr. Andrade. O coração de Maria disparou. Eduardo, eu deixa eu terminar. Ele ergueu a mão. Ouvi sobre o dinheiro, sobre as ameaças, sobre a pressão que estão fazendo em você. Maria baixou os olhos envergonhada.
E quero que saiba que admiro você por não ter aceitado na hora. Ela ergueu a cabeça surpresa. Como? Maria, trabalho com gente rica há 15 anos. Conheço esse tipo de pessoa. Eles acham que tudo no mundo tem preço, que podem comprar qualquer um. Eduardo se inclinou sobre a mesa. Mas também quero que você seja realista. Esse relacionamento vai te trazer muito sofrimento.
Por quê? Porque não sou boa o suficiente, porque o mundo deles é cruel com quem vem de fora. Eles vão te humilhar, te diminuir, fazer você se sentir pequena a cada oportunidade. Eduardo suspirou. Já vi isso acontecer antes. Com quem? Eduardo hesitou antes de responder: “Com minha filha. Carla se apaixonou por um rapaz da família Figueiredo quando tinha sua idade.
Eles namoraram escondido por dois anos. Quando a família descobriu o que aconteceu, fizeram ela se sentir tão insignificante, tão inadequada, que ela terminou tudo. Depois disso, nunca mais foi a mesma. Casou com um homem que não amava. Teve filhos que mal vê sorrir, vive uma vida sem cor. Maria sentiu um arrepio e o rapaz se casou com uma prima em seis meses.
Carla nem foi convidada para o casamento. Eduardo olhou nos olhos dela. Maria, não estou dizendo que você deve aceitar o dinheiro. Estou dizendo que deve estar preparada para a guerra que vem pela frente. Às 9:15, João ainda não havia aparecido. Maria estava começando a se preocupar quando Lúcia se aproximou.
Maria, tem um homem querendo falar com você.” Disse que é urgente. No salão principal, Maria encontrou um jovem de terno que não reconheceu. Ele se aproximou discretamente. Senhorita Maria, sou Marcos, assistente do Sr. João. Ele pediu para entregar isso. O rapaz lhe deu um bilhete dobrado e disse que é urgente.
Maria abriu o papel com mãos trêmulas. Maria, surgiu uma emergência familiar. Roberto levou o papai para o hospital. Pode ser o coração. Não consigo sair agora, mas preciso te ver ainda hoje. Pode me encontrar no Hospital São Francisco às 18 horas. Preciso te contar algumas coisas importantes. Te amo, João. O resto do dia passou numa névoa de ansiedade.
Maria mal conseguia se concentrar no trabalho. A mente dividida entre a preocupação com João e a decisão que ainda precisava tomar sobre a proposta de Roberto. Às 6 em ponto, ela estava na entrada do hospital São Francisco, um dos mais caros da cidade. O ambiente asséptico e luxuoso a intimidava, mas ela se forçou a procurar pela recepção.
“Estou procurando João Andrade”, ele disse para encontrá-lo aqui. A recepcionista, uma mulher de meia idade com óculos dourados, a examinou de cima a baixo com evidente desaprovação. O Senr. Andrade não está recebendo visitas, apenas família. Ele me pediu para vir. Sou sou namorada dele. O olhar da mulher se tornou ainda mais gelado. Ah, você deve ser a garçonete.
A forma como ela pronunciou a palavra fez Maria sentir como se tivesse sido esbofeteada. Antes que pudesse responder, ouviu uma voz familiar atrás de si. Maria era Roberto, impecável mesmo naquele ambiente hospitalar. Ele se aproximou com um meio sorriso que não chegava aos olhos. Que bom que veio. João está esperando por você.
Ele a guiou através de corredores brancos até uma sala privativa no último andar. Mas quando abriu a porta, Maria não encontrou João desesperado ao lado da cama de um pai doente. Encontrou João perfeitamente saudável, sentado numa poltrona de couro ao lado de um homem mais velho que ela reconheceu das fotos nos jornais, Coronel Figueiredo. E na terceira poltrona, uma mulher loira e elegante que ela nunca havia visto antes. Maria.
João se levantou, o rosto pálido de constrangimento. Você veio, seu pai está bem. Não houve emergência. João olhou para Roberto com raiva mal contida. Roberto mentiu para você vir. Coronel Figueiredo se levantou, estendendo a mão com cortesia militar. Senhorita Maria, muito prazer. Ouvi falar muito sobre você.
A mulher loira também se aproximou, um sorriso gelado nos lábios perfeitamente pintados. E eu sou Helena Figueiredo, filha do coronel. E ela olhou significativamente para João, antiga noiva de João. Maria sentiu o mundo girar ao seu redor. Antiga noiva? João nunca havia mencionado uma noiva anterior além da ex-esposa. Sentem-se, por favor! Convidou Roberto, assumindo o controle da situação.
Temos muito o que conversar. Maria olhou para João, procurando explicações em seus olhos, mas tudo que viu foi culpa, desespero e uma tristeza profunda que a fez compreender com o crescente horror que ela havia caído numa armadilha cuidadosamente preparada.
E pela primeira vez desde que conhecera João Andrade, Maria se perguntou se não havia cometido o maior erro de sua vida. O silêncio na sala hospitalar era ensurdecedor. Maria permaneceu de pé, recusando-se a sentar enquanto tentava processar a cena à sua frente. Roberto ocupava claramente a posição de comando. Helena sorria com superioridade mal disfarçada. Coronel Figueiredo a observava como um espécime interessante.
E João, João parecia um homem sendo levado ao patíbulo. Bem, começou Roberto, acomodando-se confortavelmente na poltrona. Agora que estamos todos aqui, podemos resolver essa situação de uma vez por todas. Que situação? Maria encontrou sua voz, surpresa pela firmeza que conseguiu imprimir as palavras. Helena riu baixinho, um som cristalino e desagradável, a situação constrangedora em que meu ex-noivo se colocou, obviamente. Maria se virou para João, que ainda não havia falado desde as apresentações. Ex-noiva, João, do que
ela está falando? João passou a mão pelos cabelos, o gesto nervoso que ela já conhecia bem. “Maria, eu posso explicar? Não há muito o que explicar”, interrompeu Helena, levantando-se e caminhando até ficar ao lado de João com propriedade possessiva. João e eu fomos noivos por três anos.
Terminamos há seis meses porque ele estava passando por uma fase complicada após o divórcio. Se meses, Maria sentiu suas pernas bambearem. Seis meses atrás, ela nem conhecia João. O relacionamento deles havia começado há apenas um mês. Roberto se inclinou para a frente, assumindo o tom de quem explica algo óbvio para uma criança.
Maria, você deve entender que homens como meu irmão às vezes passam por crises de meia idade, procuram experiências diferentes, pessoas que representem uma fuga temporária de suas responsabilidades. Fuga temporária? A frase saiu como um sussurro estrangulado. Roberto, chega. João finalmente falou, levantando-se. Não é assim, Maria. Deixe-me explicar. Explicar o que, João? Helena tocou seu braço.
Que você estava usando essa menina para se sentir jovem novamente, para provar que ainda podia conquistar qualquer mulher. Maria sentiu como se tivesse levado um soco no estômago. É verdade, João? Eu era só uma diversão. Não. João se afastou de Helena e caminhou em direção a Maria. Nunca foi isso. Eu amo você, Maria. Realmente amo.
Coronel Figueiredo pigarreou, chamando a atenção de todos. Senrita Maria, posso lhe fazer uma pergunta direta? Maria assentiu sem conseguir falar. A senhorita realmente acredita que pode fazer um homem como João feliz? Com todo o respeito, vocês vêm de mundos completamente diferentes.
João precisa de uma companheira que entenda suas responsabilidades sociais, que possa apoiá-lo nos negócios, que compartilhe de sua educação e experiências de vida. As palavras eram ditas com gentileza, mas cada uma delas era como um corte. Maria olhou para João, esperando que ele a defendesse, que rebatesse aqueles argumentos cruéis. Mas João permaneceu em silêncio, o conflito interno estampado no rosto.
Vê, Helena sorriu triunfante. Até ele sabe que é verdade. João querido, você teve sua aventura. Agora é hora de voltar à realidade. Aventura. Maria repetiu a palavra como se estivesse mastigando o vidro. Era isso que eu era para você, João? Uma aventura? Maria, não. Responde. A voz dela ecoou pela sala. Era uma aventura.
João a encarou por um longo momento e Maria viu naqueles olhos verdes não apenas amor, mas também dúvida, culpa e uma tristeza profunda. Não era uma aventura, ele disse finalmente. Mas a pausa foi devastadora, mas talvez Roberto tenha razão sobre as implicações, sobre o que isso significaria para minha carreira, para as pessoas que dependem de mim. Maria sentiu seu coração se despedaçar.
Então você está escolhendo a empresa ao invés de mim. Não é uma escolha simples assim. É sim. Maria se virou para Roberto. O envelope que você deixou comigo ontem, a proposta ainda está de pé. Roberto sorriu, um predador pressentindo a vitória. Claro que sim. Então eu aceito, Maria. Não.
João deu um passo em sua direção, mas ela recuou. Não, João, vocês têm razão. Eu não pertenço a este mundo. Nunca pertenci. As lágrimas finalmente começaram a cair, mas sua voz permaneceu firme. Aceito o dinheiro e saio da sua vida. Helena bateu palmas delicadamente. Que sábia da sua parte. Maria se virou para ela, os olhos brilhando de raiva.
E você acha que reconquistou alguma coisa? Reconquistei meu noivo. Reconquistou um homem que estava pronto para abandonar tudo por uma garçonete? Maria sorriu amargamente. Deve ser muito gratificante saber que ele só volta para você porque não teve coragem de lutar pelo amor verdadeiro. O sorriso de Helena vacilou ligeiramente. Maria se virou para João uma última vez.
Você sabe o que mais do? Não é descobrir que nossa diferença de classe sempre foi um problema. é descobrir que você não tem coragem suficiente para admitir que se apaixonou por alguém que considera inferior. Maria, por favor, não. Ela se dirigiu à porta. Roberto, envie o envelope para meu endereço. E João, espero que seja feliz com suas escolhas.
Maria saiu da sala sem olhar para trás, mas conseguiu ouvir João chamando seu nome pelo corredor. Não se virou. Não podia se virar, porque sabia que se visse o desespero no rosto dele, poderia fazer a besteira de perdoar tudo. No elevador sozinha, Maria finalmente permitiu que a dor completa a atingisse.
Soluços incontroláveis tomaram conta de seu corpo enquanto descendia lentamente pelos andares do hospital. Quando as portas se abriram no térrio, ela se recompôs o suficiente para caminhar até a saída. Do lado de fora, a cidade de Belo Horizonte continuava sua vida normal, alheia ao fato de que o coração de uma garçonete havia acabado de se despedaçar completamente.
Mas enquanto esperava o ônibus que a levaria de volta ao Barreiro, Maria tomou uma decisão. Aquele dinheiro pagaria sua faculdade, mas ela nunca mais permitiria que alguém a fizesse sentir pequena. Nunca mais. Se João Andrade não teve coragem de lutar por ela, Maria Guimarães teria coragem de lutar por si mesma.
E nas profundezas de sua dor, uma nova força começava a nascer. Duas semanas se passaram desde a confrontação no hospital. Maria havia pedido demissão do café imperial. não conseguia suportar a possibilidade de ver João novamente e agora trabalhava em dois lugares. Pela manhã numa lanchonete no centro, à tarde numa loja de roupas no shopping.
O dinheiro de Roberto havia chegado conforme prometido, mas ela decidira não tocá-lo imediatamente. Primeiro precisava provar para si mesma que podia sobreviver sozinha. Dona Rosa observa a neta com preocupação crescente. Maria havia se tornado uma versão fantasma de si mesma. funcionava, trabalhava, conversava quando necessário, mas a luz em seus olhos se apagara completamente.
“Neta, você precisa conversar com alguém”, disse Rosa numa noite, encontrando Maria na cozinha às 2as da madrugada, bebendo chá e foliando obsessivamente folhetos de universidades. Estou conversando com você sobre o que aconteceu de verdade, sobre como você está se sentindo. Maria ergueu os olhos dos papéis. Estou me sentindo idiota, avó.
Idiota por ter acreditado que um conto de fadas poderia ser real e com raiva, furiosa. A resposta saiu com uma intensidade que surpreendeu ambas. Furiosa com ele por ser covarde, com a família dele por serem preconceituosos e comigo mesma por ter sido ingênua o suficiente para achar que amor era mais forte que dinheiro. Rosa se sentou ao lado da neta.
E agora? Agora eu vou usar o dinheiro deles para me tornar alguém que eles nunca mais possam diminuir. Maria bateu a mão sobre os folhetos. Vou fazer psicologia. Vou me formar. Vou ajudar pessoas como eu a não se sentirem pequenas. E se um dia cruzar com João Andrade novamente, ele vai ver exatamente o que perdeu.
Na manhã seguinte, Maria estava organizando os expositores da loja quando viu através da vitrine uma figura familiar caminhando pelo corredor do shopping. Era Marcos o assistente de João e ele parecia estar procurando por algo ou alguém. Quando seus olhares se cruzaram através do vidro, Marcos acenou e se aproximou da entrada da loja.
Senhorita Maria, posso falar com a senhora um momento? Maria hesitou, mas a curiosidade venceu. O que você quer, Marcos? É sobre o senhor João. Marcos olhou ao redor, nervoso. Ele Ele não está bem. Não é problema meu. Por favor, só me escute. Marcos baixou a voz. Depois que a senhora saiu do hospital naquele dia.
Ele teve uma discussão terrível com o irmão e com a senrita Helena. Gritaram tanto que a segurança do hospital teve que intervir. Apesar de si mesma, Maria sentiu um aperto no coração. E daí? Ele rompeu o noivado com Helena na mesma hora. Disse que preferia perder tudo a viver uma mentira. Marcos fez uma pausa e ontem, ontem ele demitiu Roberto da empresa.
Maria quase derrubou o cabide que segurava. Ele fez o quê? descobriu que Roberto estava usando fundos da empresa para investimentos pessoais sem autorização. Não eram grandes quantias, mas o suficiente para justificar a demissão. Marcos se inclinou mais para perto. Senrita Maria, o Senr. João está destruído. Não come, mal dorme e cancelou todas as reuniões da semana.
Por que você está me contando isso? Porque ele me pediu para encontrá-la. quer conversar e explicar direito o que aconteceu naquele dia. Maria balançou a cabeça vigorosamente. Não, não quero vê-lo. Ele disse que entenderia se a senhora recusasse, mas pediu para eu entregar isso. Marcos tirou do bolso um envelope pequeno e o estendeu para Maria. Ela o pegou com mãos trêmulas. O que é? Uma carta.
E outra coisa, depois que Marcos saiu, Maria escondeu o envelope na bolsa e tentou se concentrar no trabalho, mas durante todo o dia sentia como se o papel queimasse através do couro da bolsa. Só quando chegou em casa, após dona Rosa já terse deitado, Maria finalmente abriu o envelope.
Dentro havia uma carta manuscrita e um pequeno objeto embrulhado em papel de seda. Maria, não sei se você vai ler isso, mas preciso tentar. Primeiro, quero pedir desculpas por tudo que aconteceu naquele dia. Roberto armou aquela situação sem me consultar, mas isso não desculpa, minha covardia. Você estava certa. Eu não tive coragem de lutar por nós quando precisava ter.
Deixei que o medo de perder a empresa, de decepcionar as pessoas que dependem de mim fosse mais forte que o amor que sinto por você. Helena mentiu sobre várias coisas. Sim, fomos noivos, mas terminamos há dois anos, não há seis meses. Ela tentou reatar várias vezes, mas eu nunca quis. Até conhecer você, achei que não seria capaz de amar de verdade novamente. Demiti Roberto ontem.
Descobri que ele estava desviando dinheiro e usando informações privilegiadas para benefício próprio. Também rompi definitivamente com Helena e cancelei qualquer negócio com a família Figueiredo. Sei que pode ser tarde demais para nós. Sei que você tem todo o direito de me odiar, mas queria que soubesse que você mudou minha vida.
me fez lembrar de quem eu realmente sou por baixo de todos esses ternos e responsabilidades. O objeto no papel de seda é uma chave da casa da fazenda em Capitólio que mencionei uma vez. Está no seu nome agora, junto com um fundo que garante a manutenção e impostos para sempre. Não é para te comprar. Sei que você não está à venda.
É para que tenha um lugar seu onde possa ir quando precisar de paz. Eu te amo, Maria. Vou te amar sempre, independentemente do que decidir sobre nós, com todo meu carinho e arrependimento. João, PS: Use o dinheiro que Roberto te deu para sua faculdade. Você merece muito mais que isso, mas é um começo.
Maria leu a carta três vezes antes de abrir o papel de seda. Realmente havia uma chave pequena e dourada junto com documentos que confirmavam a transferência de propriedade. Uma casa. Ele havia dado a ela uma casa. Maria desabou na cadeira da cozinha, as emoções se chocando dentro dela como ondas numa tempestade.
Raiva, amor, gratidão, dor, esperança, tudo misturado numa confusão insuportável. Parte dela queria correr até ele, perdoar tudo, recomeçar. Parte dela queria devolver tudo e nunca mais ouvir falar de João Andrade. Mas uma terceira parte, uma voz nova e mais forte, sussurrava algo diferente, que talvez fosse hora de parar de tomar decisões baseadas no que João fazia ou deixava de fazer, e começar a tomar decisões baseadas no que ela, Maria Guimarães, queria para sua própria vida.
E pela primeira vez, em duas semanas, ela soube exatamente o que precisava fazer. Maria passou três dias carregando a carta de João na bolsa, sem saber o que fazer com ela. Tentava se concentrar no trabalho, nos planos para a faculdade, nas conversas com dona Rosa, mas constantemente se pegava relendo as palavras escritas à mão, tocando a pequena chave dourada.
Na quarta manhã, ela acordou com uma clareza que não sentia há semanas. Havia uma conversa que precisava ter, não com João, mas consigo mesma, e sabia exatamente onde essa conversa deveria acontecer. “Vó, preciso viajar hoje”, anunciou durante o café da manhã. Rosa ergueu os olhos da xícara. “Para onde, Capitólio? Há uma coisa que preciso ver.
Sozinha? Sozinha? Rosa estudou o rosto da neta por um longo momento. Tem a ver com aquele envelope que você anda carregando?” Maria assentiu. “Você confia em mim, vó? Confio. Sempre confiei. Rosa segurou sua mão. Só me promete que vai voltar. Prometo. A viagem de ônibus até Capitólio durou 4 horas. Maria passou o tempo observando a paisagem mineira se transformar de urbana para rural, montanhas cobertas de verde se sucedendo até chegarem à região dos lagos.
Quando finalmente desceu na rodoviária da pequena cidade turística, sentiu como se estivesse entrando num mundo diferente. O táxi que a levou para o endereço da carta subiu por uma estrada de terra que margeava o lago de Furnas. A água azul esverdeada se estendia até o horizonte, pontilhada de pequenas ilhas e cercada por montanhas suaves. Era mais bonito do que Maria havia imaginado.
A casa ficava numa pequena elevação com vista para o lago. Era simples, mas charmosa. Paredes brancas, telhado de cerâmica vermelha, uma varanda que se abria para a paisagem infinita, um jardim selvagem cercava a construção, cheio de flores que cresciam sem muito planejamento, mas com abundante beleza. Maria usou a chave com mãos trêmulas.
A porta se abriu para um interior aconchegante, móveis rústicos, mas confortáveis, uma lareira de pedra, janelas grandes que traziam a natureza para dentro. Tudo limpo e bem cuidado, como se alguém tivesse se preparado para sua chegada. Na mesa da sala de jantar encontrou outro envelope com seu nome. Maria. Se você está lendo isso, significa que veio conhecer a casa.
Fico feliz por isso. Contratei a dona Teresa, que mora aqui perto, para manter tudo em ordem. Na geladeira há comida fresca e ela deixou o telefone dela caso precise de alguma coisa. Espero que este lugar traga a você. um pouco da paz que sempre me trouxe. João. Maria colocou a carta sobre a mesa e caminhou até a varanda.
O lago se estendia diante dela, silencioso e eterno. Pela primeira vez em semanas, sentiu seus ombros relaxarem completamente. Passou o dia explorando a casa e os arredores. Havia uma pequena trilha que levava até a margem do lago, onde uma doca rústica se projetava sobre a água.
Maria se sentou ali quando o sol começou a se pôr, pintando o céu de cores que ela nunca havia visto em Belo Horizonte. Foi ali com os pés descalços na água morna do lago que Maria finalmente conseguiu pensar com clareza sobre tudo que havia acontecido. João a havia ferido profundamente ao não defendê-la naquele dia no hospital.
havia demonstrado covardia exatamente quando ela mais precisava de sua força. Isso era innegável, mas também era innegável que ele havia tomado medidas drásticas depois disso. Rompera com Helena, demitira Roberto, cancelara negócios importantes e, mais importante, havia reconhecido seus erros e tentado repará-los. A pergunta que Maria se fazia não era se João merecia perdão.
A pergunta era se ela queria dar a ele e a si mesma uma segunda chance. O que eu realmente quero? Perguntou em voz alta para o lago. A resposta veio não em palavras, mas em imagens que se formaram em sua mente. Ela e João conversando na varanda daquela casa, dividindo sonhos e medos.
Ela estudando psicologia na universidade, tornando-se a profissional que sempre sonhara ser. Os dois construindo algo juntos, não baseado na diferença de classes, mas na igualdade do amor e do respeito mútuo. Era possível? Depois de tudo que havia acontecido, Maria passou a noite na casa, dormindo numa cama que cheirava a lavanda e acordando com o som dos pássaros sobre o lago.
Pela manhã, sua decisão estava tomada, mas primeiro havia algo que precisava fazer. De volta a Belo Horizonte, no ônibus da tarde, Maria ligou para Marcos do celular de dona Rosa. Marcos, é Maria. Preciso que você entregue um recado para João. Claro, senhorita.
Qualquer coisa, diga a ele que aceito conversar, mas não nos lugares de sempre, não nos ambientes dele. Maria olhou pela janela do ônibus, vendo a cidade se aproximar. Amanhã, 7 horas da noite, na igreja do Rosário. Se ele quiser mesmo uma segunda chance, tem que vir até meu mundo desta vez. Eu entrego o recado. E Marcos, diga a ele que se aparecer com irmão, noiva, sócios ou qualquer outra pessoa, eu vou embora sem olhar para trás.
Desta vez, a conversa é só entre nós dois. Quando desligou o telefone, Maria sabia que havia cruzado mais uma linha. Não era mais a garçonete ingênua que se apaixonara por um empresário rico. Era uma mulher que sabia seu valor e estava disposta a lutar por ele. Mas apenas se o homem do outro lado também estivesse disposto a lutar.
Agora, só restava esperar para ver se João Andrade realmente havia mudado tanto quanto dizia em suas cartas. A igreja do Rosário se erguia majestosa na praça sete, suas torres barrocas recortadas contra o céu alaranjado do final da tarde. Maria chegou alguns minutos antes das 7, usando o vestido azul marinho que João havia comprado para ela semanas atrás.
uma escolha deliberada que ela esperava que ele compreendesse. Sentou-se num dos bancos do fundo, observando os poucos fiéis que ainda rezavam após a missa da tarde. O ambiente era perfeito para o que ela queria, neutro, sereno, um lugar onde tanto ela quanto João estariam em pé de igualdade diante de algo maior que ambos.
Às sete, em ponto exato, ouviu passos ecuando pelas pedras antigas. Virou-se e viu João caminhando pelo corredor central. mais magro do que lembrava, o rosto carregando marcas de noites mal dormidas. Ele usava jeans e uma camisa branca simples, nada dos ternos caros que eram sua marca registrada. Maria, ele parou ao lado do banco, claramente esperando permissão para se sentar. Ela deslizou para o lado, fazendo espaço.
João, eles ficaram alguns minutos em silêncio, o peso de tudo que não havia sido dito pairando entre eles como incenso. Finalmente, João falou: “Obrigado por aceitar me ver. Obrigado por vir até aqui.” Ele sorriu tristemente. Você escolheu bem o lugar. Aqui somos só duas pessoas tentando acertar as coisas. É exatamente o que eu queria. Maria se virou para encará-lo. João, antes de qualquer coisa, preciso te dizer uma coisa.
Eu te perdoo. Os olhos dele se encheram de lágrimas. Maria, deixa eu terminar. Ela ergueu a mão. Eu te perdoo por ter sido covarde naquele dia, por ter deixado que sua família me humilhasse, por não terme defendido quando eu mais precisava. João baixou a cabeça. Não mereço seu perdão. Não é sobre merecer, é sobre eu escolher não carregar raiva e ressentimento. Maria respirou fundo.
Mas perdoar não significa esquecer e não significa que estou pronta para voltar ao que éramos. Ele ergueu os olhos, uma mistura de esperança e medo na expressão. O que significa então? Significa que se você realmente quer uma segunda chance comigo, vai ter que ser diferente desta vez. Totalmente diferente.
Como assim? Maria se acomodou melhor no banco, organizando os pensamentos. João, nós nos conhecemos num contexto onde eu era a garçonete e você era o cliente rico. Todo o nosso relacionamento foi baseado nesse desequilíbrio de poder, mas eu nunca te tratei como inferior. Não conscientemente não.
Mas quando a pressão chegou, quando teve que escolher entre mim e seu mundo, você escolheu seu mundo. Maria tocou seu braço gentilmente. E eu entendo porê. Tinha muita coisa em jogo. João fechou os olhos. tinha, mas não deveria ter importado. Nada deveria ter sido mais importante que você. Agora você diz isso, mas e da próxima vez que a pressão vier? E se seus novos sócios não me aprovarem? E se a sociedade mineira nos julgar? E se tivermos filhos e eles sofrerem preconceito na escola por causa da origem da mãe? As perguntas atingiram João como socos.
Maria, eu eu não pensei em tudo isso. Pois é, por isso que não podemos simplesmente voltar onde paramos. Maria segurou as mãos dele. Se você quer mesmo ficar comigo, vai ter que aceitar que isso não será um conto de fadas. Vai ser trabalho duro todos os dias, construindo algo novo juntos. Eu aceito. Aceito qualquer coisa. Então me escuta. Maria endireitou os ombros.
Vou começar a faculdade de psicologia no próximo semestre. Pretendo me formar e trabalhar ajudando pessoas. Não vou ser a esposa troféu de ninguém, nem a mulher que fica em casa enquanto o marido constrói um império. João assentiu energicamente. Eu apoio totalmente e não quero seu dinheiro para isso.
Vou usar o que Roberto me deu para a faculdade e vou trabalhar para me sustentar. Preciso provar para mim mesma que posso conseguir as coisas sozinha. Mas, Maria, você não precisa. Preciso sim. Preciso saber que se um dia decidir ficar com você, é porque quero, não porque preciso. Maria fez uma pausa e você vai ter que aceitar que talvez eu decida não ficar.
O silêncio que se seguiu foi longo e pesado. João olhava para as próprias mãos, processando cada palavra. E se eu aceitar tudo isso? perguntou finalmente, se eu apoiar seus estudos, respeitar sua independência, enfrentar qualquer preconceito que vier, haveria uma chance para nós? Maria sentiu seu coração acelerar.
Haveria a possibilidade de reconstruirmos alguma coisa, não o que éramos, mas algo novo, algo igual. Como seria? Começaríamos de novo como amigos primeiro, sem pressa, sem pressão, sem grandes declarações. Maria sorriu pela primeira vez desde que ele chegara. Você me deixaria te conhecer de verdade.
Não só o empresário bem-sucedido, mas o homem que escreve poemas ruins e sonha com uma vida mais simples. João Rio, um som genuíno que ecoou pelas paredes antigas da igreja. Meus poemas são realmente ruins e eu te deixaria me conhecer de verdade também. A estudante de psicologia, a neta dedicada, a mulher que ainda está descobrindo quem realmente é. Eu gostaria muito disso. Maria estendeu a mão para ele.
Então, que tal começarmos? Oi, eu sou Maria Guimarães. Muito prazer. João pegou sua mão, apertando-a com gentileza. João Andrade, o prazer é todo meu. E ali na igreja do Rosário, cercados pela história de Belo Horizonte e pela promessa de um futuro incerto, mas possível, dois corações feridos começaram a primeira página de uma nova história.
Uma história que seria escrita em pé de igualdade, uma palavra de cada vez. Três meses se passaram desde o encontro na Igreja do Rosário. Maria estava no primeiro semestre de psicologia na UFMG. havia conseguido uma bolsa parcial através do Enem e cobria o restante com os próprios recursos. João cumprira religiosamente sua promessa, respeitava o espaço dela, apoiava seus estudos à distância e não pressionava por definições sobre o relacionamento.
Eles se encontravam uma vez por semana, sempre em lugares simples escolhidos por Maria. Uma lanchonete perto da universidade, o parque municipal, uma livraria no centro. Conversavam sobre tudo, os estudos dela, as mudanças na empresa dele, sonhos, medos, pequenas descobertas do dia a dia. Lentamente, uma amizade genuína começou a florescer. “Como foi a prova de desenvolvimento humano?”, perguntou João numa tarde de quinta-feira, enquanto dividia um açaí na Praça da Liberdade. “Difícil, mas acho que me saí bem.” Maria sorriu. Professor Henrique disse uma coisa
interessante na semana passada, que a psicologia não é sobre consertar pessoas quebradas, é sobre ajudá-las a encontrar suas próprias forças. Faz sentido. João a observava com admiração mal disfarçada. Você estava brilhando quando falou sobre isso. É lindo ver você no seu elemento. Maria corou ligeiramente.
Nos últimos meses, havia aprendido a aceitar os elogios de João sem desconfiança, mas ainda a deixavam um pouco sem jeito. E você, como está lidando com a empresa sem Roberto? O rosto de João se ensombreu um pouco. Está sendo desafiador. Ele realmente entendia de números, mesmo com todos os defeitos. Tive que contratar dois diretores financeiros para fazer o trabalho que ele fazia sozinho.
Você se arrepende de ter demitido ele? Nunca. A resposta foi imediata e firme. Foi a melhor decisão que tomei. A empresa está menor agora, mas mais honesta e eu durmo melhor à noite. Maria sorriu. Você mudou muito, João. Para melhor, espero. Definitivamente para melhor. Eles foram interrompidos por uma voz familiar atrás deles. Maria, Maria Guimarães.
Maria se virou e viu Lúcia, sua antiga colega do café imperial, acompanhada de um homem que ela não conhecia. Lúcia, que surpresa. Maria se levantou para abraçar a amiga. Como você está? Bem, muito bem. Me casei. Lúcia exibiu uma aliança simples. Este é meu marido, Carlos. Após as apresentações, Lúcia olhou curiosa para João.
E você deve ser o famoso empresário que virou a cabeça da nossa Maria. João? Ele se apresentou estendendo a mão. Muito prazer. Nossa, vocês dois voltaram mesmo. Lúcia parecia empolgada. Todo mundo no café. especulava o que tinha acontecido quando vocês sumiram na mesma época. Maria trocou um olhar com João. Eles haviam conversado sobre isso. Como lidar com as perguntas das pessoas que conheciam a história anterior.
“Na verdade, estamos recomeçando”, explicou Maria devagar e com cuidado desta vez. “Que romântico!”, Lúcia bateu palmas. “Carlos, não te falei que eles eram como Romeu e Julieta moderno? Carlos Riu. Ela não para de falar de vocês dois. diz que é a maior história de amor que já viu de perto.
Depois que Lúcia e Carlos se despediram, Maria e João caminharam em silêncio por alguns minutos. “História de amor”, murmurou Maria. “É assim que as pessoas nos vem. Te incomoda um pouco? Porque ainda não sei se é isso que somos.” Maria parou de caminhar. “João, posso te fazer uma pergunta direta?” “Claro. Estes três meses foram o que você esperava? Digo, está sendo difícil para você ir devagar assim? João considerou a pergunta cuidadosamente.
Se você tivesse me perguntado isso há seis meses, eu diria que sim, que estaria desesperado para acelerar as coisas. Mas ele sorriu. Tem sido incrível te conhecer desta forma, sem pressa, sem pressão. Sinto como se estivesse descobrindo uma pessoa completamente nova. E você gosta dessa pessoa nova? Amo essa pessoa nova. As palavras saíram naturalmente, sem o peso dramático das declarações do passado.
Maria, eu te amo, não da forma possessiva e desesperada de antes, mas de uma forma tranquila, como se amasse uma parte de mim mesmo que eu não sabia que existia. Maria sentiu lágrimas se formarem em seus olhos. João, não precisa responder nada agora. Só queria que soubesse. Maria se aproximou e beijou sua bochecha suavemente.
Eu também amo você e acho que finalmente sei que tipo de amor é esse. Que tipo? O tipo que não precisa de promessas impossíveis ou gestos grandiosos. O tipo que cresce um dia de cada vez, uma conversa de cada vez, uma descoberta de cada vez. João segurou sua mão. É o melhor tipo de amor. Naquela noite, Maria chegou em casa e encontrou dona Rosa esperando na sala, tricotando o mesmo cachicol laranja que parecia nunca terminar. Como foi o encontro com João? Bom, muito bom.
Maria se sentou ao lado da avó. Vó, posso te contar uma coisa? Claro, neta. Acho que estou pronta para dar o próximo passo com ele. Rosa parou de tricotar e olhou atentamente para Maria. Que próximo passo? Não sei ainda, mas sinto que os últimos três meses curaram alguma coisa em nós dois, que talvez possamos tentar construir algo real juntos.
E você tem certeza de que é o que quer? Não é só o coração falando. Maria sorriu. É o coração falando, sim, mas também a cabeça e a intuição e tudo mais que sou. Rosa retomou o tricô, um pequeno sorriso nos lábios. Então, acho que está na hora de ele conhecer melhor esta família.
Que tal trazer ele para jantar domingo? Sério, vó? Sério? Se ele vai fazer parte da nossa vida, precisa saber como vivemos de verdade. Maria abraçou a avó, sentindo como se mais uma peça do quebra-cabeças de sua vida tivesse se encaixado no lugar certo. O domingo amanheceu com um céu azul sem nuvens, típico dos fins de março em Belo Horizonte.
Maria acordou cedo, nervosa com o jantar que havia planejado. Seria a primeira vez que João visitaria sua casa. Conheceria de fato como ela e dona Rosa viviam. “Calma, neta”, disse Rosa, observando Maria limpar pela terceira vez a mesa da sala. “A casa está impecável. E se ele achar muito simples?” “E se ele achar muito simples, então não é o homem certo para você”. Rosa segurou as mãos da neta.
Maria, lembra do que sempre te ensinei. Nunca se envergonhe de quem você é ou de onde veio. Maria respirou fundo. Tem razão, vó. É que é importante para mim que vocês se gostem. Se ele faz você feliz, eu vou gostar dele. Às 5 da tarde, a campainha tocou. Maria abriu a porta e encontrou João segurando um buquê de flores do campo e uma cesta de vime. “Oi”, disse ele, mais nervoso que ela.
Trouxe algumas coisas. Maria espiou dentro da cesta pães caseiros, geleias artesanais, frutas frescas e uma garrafa de vinho que não parecia cara demais para o ambiente. “Você foi perfeito”, sussurrou ela, se erguendo na ponta dos pés para beijar sua bochecha. Dona Rosa apareceu na sala apoiada na bengala, vestindo seu melhor vestido, azul marinho com pequenas flores brancas e os óculos limpos para a ocasião. Dona Rosa, João se aproximou respeitosamente.
É uma honra conhecê-la, Maria fala da senhora constantemente. Imagino que sim. Eu criei essa menina, então ela sabe que não pode me esconder nada por muito tempo. Rosa aceitou as flores com um sorriso. São lindas. Fazia tempo que não ganhava flores de um homem. João se acomodou na sala pequena, mas aconchegante, olhando ao redor com interesse genuíno.
Maria observava sua reação, procurando sinais de desconforto ou condescendência, mas encontrando apenas curiosidade respeitosa. Esta foto aqui, João apontou para uma moldura na estante. São os pais de Maria? São sim, Roberto e Silmara. Morreram quando ela tinha 5 anos. Rosa se acomodou na poltrona. Desde então somos só nós duas. Maria me contou. Deve ter sido difícil criar uma criança sozinha. Foi.
Mas também foi a melhor coisa que já fiz na vida. Rosa olhou carinhosamente para a neta. Essa menina é meu orgulho maior. Durante o jantar, frango assado com quiabo, arroz, feijão tropeiro e couve refogada, a conversa fluiu naturalmente. João fez perguntas sobre a vida no bairro, escutou histórias da infância de Maria, dividiu memórias próprias da época em que o pai ainda vivia.
Sabe”, disse Rosa enquanto serviam a sobremesa, doce de mamão que ela mesma fazia. “Maria me contou que você escreve poemas”. João corou ligeiramente. Escritos ruins, dona Rosa. Mais um passatempo que talento. Mesmo assim, gostaria de ouvir um vó. Maria protestou constrangida. Tudo bem. João sorriu. Escrevi um recentemente que, bom, foi inspirado em alguém especial. Ele tirou um papel dobrado do bolso da camisa.
Não costumo recitar meus poemas, mas para as mulheres mais importantes da minha vida aprendi que o amor não vem com manual de instruções, não obedece a lógicas de classe ou razão, chega devagar como água que modela pedra ou de repente como chuva em terra seca.
Aprendi que amar é mais que sentir, é escolher todos os dias construir, não castelos de areia que o vento desfaz, mas bases sólidas, onde a paz encontra lugar. E aprendi, olhando nos seus olhos, que o maior tesouro não se guarda em cofres, mas se planta no coração de quem sabe que amor verdadeiro é porta que nunca se abre para quem não tem coragem de ficar. O silêncio que se seguiu foi carregado de emoção.
Rosa limpou discretamente os olhos com o guardanapo e Maria sentiu lágrimas escorrerem pelo rosto. Foi lindo, meu filho! Disse Rosa finalmente. Realmente lindo. Obrigado. João dobrou o papel cuidadosamente. Vocês são as primeiras pessoas a ouvirem. Depois do jantar, eles se acomodaram na pequena varanda dos fundos, observando o movimento tranquilo da rua. Rosa se recolheu cedo, mas não antes de sussurrar no ouvido de Maria.
Este é bom, neta, diferente dos outros. Que outros, vó? Você sabe que não ouve outros. Exato. Por isso sei que este é especial. Sozinhos na varanda, Maria e João conversaram até tarde da noite. Ele contou sobre a infância privilegiada, mas solitária, sobre a pressão de assumir a empresa jovem demais, sobre os casamentos que fez por conveniência ao invés de amor.
“Sabe o que mais me impressionou hoje?”, disse ele, segurando a mão dela. “O quê? A forma como você e dona Rosa se tratam? O respeito mútuo, o carinho genuíno, a forma como vocês se apoiam?” João apertou sua mão. Cresci numa família rica, mas nunca vi tanto amor quanto vi hoje nesta casa simples. Nossa casa sempre foi baseada no amor. É tudo que tínhamos para dar. É tudo que alguém precisa, na verdade.
Maria se virou para ele na cadeira de balanço. João, posso te perguntar uma coisa? Qualquer coisa. Você realmente consegue me imaginar neste mundo seu, nos eventos sociais, nas reuniões importantes, convivendo com a elite empresarial? João refletiu cuidadosamente antes de responder: “Consigo, mas não porque acho que você deveria se adaptar ao meu mundo, porque acho que meu mundo precisa ser transformado pelo que você representa.
E o que eu represento? Autenticidade, coragem. A lembrança de que sucesso não se mede apenas em dinheiro, mas na qualidade dos relacionamentos que construímos. João se inclinou para mais perto. Maria, você me fez perceber que passei anos vivendo uma vida que não era realmente minha e agora? Agora quero construir uma vida que seja nossa, não minha ou sua, mas nossa. Maria sentiu seu coração acelerar.
Era a declaração que havia esperado ouvir. Não de amor desesperado, mas de parceria real. João, ela disse suavemente. Acho que estou pronta. Pronta para quê? Para ser sua namorada de verdade, desta vez sem medo, sem pressa, mas também sem mais hesitação. O sorriso que se abriu no rosto de João iluminou toda a varanda. Ele se levantou, puxou-a da cadeira e a beijou ali mesmo sob as estrelas do Barreiro, selando finalmente o recomeço que ambos haviam construído com tanto cuidado, paciência e amor verdadeiro.
Seis meses depois do jantar na casa de Maria, o relacionamento entre ela e João havia encontrado um ritmo perfeito. Ela estava no terceiro semestre de psicologia. Suas notas eram excelentes e já havia conseguido um estágio numa clínica social que atendia comunidades carentes. João havia reestruturado completamente a empresa, focando em projetos sustentáveis e responsabilidade social.
Eles passavam os fins de semana na casa de Capitólio, onde João havia instalado um pequeno escritório e Maria estudava na varanda com vista para o lago. Dona Rosa os visitava frequentemente e sua saúde havia melhorado consideravelmente. Os médicos diziam que a felicidade da neta era o melhor remédio. Era uma manhã de terça-feira quando a bomba explodiu. João estava no escritório da empresa quando recebeu a ligação de Marcelo Viana, um dos maiores investidores de Minas Gerais.
João, meu amigo, tem uma proposta que pode mudar sua vida. Estou ouvindo, Marcelo. A Petrominas quer comprar o grupo Andrade. Oferta de R$ 500 milhões deais cash. Você fica como CEO regional. Salário de 2 milhões por ano mais bônus. João quase derrubou o telefone. 500 milhões era cinco vezes mais do que a empresa valia no mercado.
Por que estão oferecendo tanto? Precisam de alguém com sua reputação para comandar as operações em Minas. Alguém limpo, respeitado, que dê credibilidade aos projetos deles. Marcelo fez uma pausa, mas há uma condição. Qual? Você precisa se casar até o final do ano com alguém adequado ao cargo. A Petrominas é uma empresa familiar tradicional. O CEO precisa proar estabilidade e valores conservadores. O estômago de João revirou adequado.
Como? João, você sabe como funciona. Alguém da nossa classe social com formação superior completa, preferencialmente de família conhecida. Nada, pessoal, é só business. Depois de desligar, João ficou uma hora inteira olhando pela janela do escritório, a proposta ecoando em sua mente. 500 milhões seria a independência financeira total, a garantia de que nunca mais precisaria se preocupar com dinheiro, a possibilidade de ajudar milhares de pessoas através dos projetos da Petrominas. Mas a condição, naquela noite, ele chegou em casa mais tarde que
o normal, encontrando Maria estudando na mesa da cozinha. Ela ergueu os olhos dos livros e imediatamente percebeu que algo estava errado. O que aconteceu? João se sentou pesadamente na cadeira ao lado dela. Recebi uma proposta hoje. Uma proposta que mudaria tudo para nós. Maria fechou o livro e deu toda sua atenção a ele.
Que tipo de proposta? João contou tudo, a oferta da Petrominas, o dinheiro envolvido, as possibilidades que se abririam e, finalmente, a condição sobre o casamento. O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Maria ficou muito tempo olhando para as próprias mãos antes de falar. R00 milhões de reais, murmurou Maria. Eu é muito dinheiro, João. Não me importo com o dinheiro.
Importo-me com você. Maria ergueu os olhos e João viu lágrimas se formando. Você tem certeza disso? Absoluta. Já tomei minha decisão. Vou recusar a oferta. Não. A resposta de Maria o surpreendeu. Não pode recusar sem pensar direito. Não há o que pensar. Não vou abrir mão de você por dinheiro. Nunca mais.
Maria se levantou e caminhou até a janela. João, essa pode ser a oportunidade da sua vida. Com esse dinheiro você poderia ajudar muito mais pessoas, fazer muito mais diferença no mundo e perderia a pessoa mais importante da minha vida. Não necessariamente. Maria se virou, o rosto marcado por uma determinação que ele não esperava.
E se houvesse um jeito de eu me tornar adequada aos olhos deles? Como assim? Poderia acelerar minha formação, fazer cursos de etiqueta social, aprender a me comportar nos círculos empresariais? Maria falava rapidamente, como se tentasse se convencer. Muitas pessoas da classe trabalhadora conseguem acender socialmente.
João se levantou e foi até ela, segurando seus ombros. Maria, pare. Você está ouvindo o que está dizendo? Estou tentando encontrar uma solução. Uma solução que exige que você mude completamente quem é. João a virou para encará-lo. Maria, você lembra porque nos apaixonamos? Porque você era autêntica, corajosa, verdadeira.
Você lembra porque terminamos da primeira vez? Porque eu deixei que outras pessoas me convencessem de que você não era adequada. As lágrimas de Maria finalmente caíram. Mas João é muito dinheiro. Pense em tudo que poderia fazer e pense em tudo que perderia. Você, sua autenticidade, nossa felicidade. João segurou o rosto dela com as duas mãos.
Maria, se eu aceitar essa proposta com as condições deles, estarei mandando uma mensagem clara, que concordo que existe um tipo adequado de pessoa para se amar. E não concordo. E se eu quiser tentar? E se eu quiser me esforçar para não? João a beijou suavemente. Não vou permitir que mude uma vírgula de quem você é por causa de dinheiro ou status. Se eles não conseguem ver o quanto você é extraordinária, exatamente como é, o problema é deles, não seu.
Maria desabou em soluços. Mas e se você se arrepender? E se um dia olhar para trás e pensar que perdeu a chance da sua vida por minha causa? Maria João a puxou para um abraço apertado. Você quer saber qual foi a chance da minha vida? Foi aquele dia no café imperial, quando uma garçonete corajosa teve a ousadia de me dizer que eu parecia perdido.
Foi quando descobri que existe algo mais valioso que dinheiro, encontrar alguém que nos ama exatamente como somos. Eles ficaram abraçados por longos minutos, até que Maria se afastou ligeiramente. Tem certeza, João? Certeza absoluta. Nunca tive tanta certeza de nada na vida. No dia seguinte, João ligou para Marcelo Viana.
Marcelo, obrigado pela oferta, mas vou recusar. João, você está louco. 500 milhões é muito dinheiro mesmo, mas não vale o preço que teria que pagar. Que preço? Minha integridade e a mulher que amo. Quando desligou o telefone, João sentiu como se um peso enorme tivesse saído de seus ombros. Pela janela, viu Maria chegando da faculdade, os livros debaixo do braço, um sorriso no rosto ao vê-lo através do vidro, e soube, sem sombra de dúvida, que havia feito a escolha certa.
Um ano depois, o sol da manhã filtrava através das cortinas de linho branco da casa em Capitólio, despertando Maria com a suave brisa que vinha do lago. Ela se espreguiçou na cama, sentindo o espaço vazio ao seu lado, ainda morno. João sempre acordava mais cedo. Tinha o hábito de admirar o nascer do sol com uma xícara de café. Era sábado, dia especial.
Fazia exatamente um ano desde que João havia recusado a proposta da Petrominas e dois anos desde o primeiro encontro deles no café imperial. Maria havia proposto uma pequena celebração. Nada grandioso, apenas eles três e alguns amigos próximos. Ela encontrou João na varanda exatamente onde imaginara. Ele usava apenas shorts e uma camiseta velha, os pés descalços apoiados no parapeito enquanto observava o lago dourado pelos primeiros raios solares.
“Bom dia”, sussurrou ela, abraçando-o por trás. “Bom dia, meu amor.” Ele puxou-a para seu colo. Como dormiu? Perfeitamente. “E, sem arrependimentos sobre ontem? Na véspera, João havia vendido oficialmente o grupo Andrade para um consórcio de empresários mineiros, não pelos 500 milhões da Petrominas, mas por um valor justo que permitira a todos os funcionários manterem seus empregos e ainda lhe garantir a independência financeira suficiente para nunca mais ter que se preocupar com dinheiro. “Nenhum arrependimento”, respondeu ele, beijando sua testa. “Me sinto mais leve do que em
anos.” Maria se acomodou melhor em seu colo, observando a paisagem que se tornara seu refúgio. Sabe o que estava pensando? O quê? Em como nossa vida é diferente do que imaginávamos dois anos atrás. João riu baixinho. Você quer dizer quando eu era um empresário workaholic e você era uma garçonete que sonhava com psicologia. Exato. Olha para nós agora. E realmente era impressionante a transformação.
Maria estava no último ano de psicologia. Suas notas eram as melhores da turma e já havia recebido propostas para fazer mestrado. Além disso, trabalhava três dias por semana numa clínica comunitária no Barreiro, realizando exatamente o sonho que sempre tivera, ajudar pessoas a encontrarem suas próprias forças.
João havia se tornado consultor em sustentabilidade empresarial, trabalhando apenas com empresas que compartilhavam seus valores. Ganhava menos dinheiro do que antes, mas tinha tempo para escrever. Seus poemas haviam melhorado consideravelmente para cuidar da pequena horta orgânica que plantara nos fundos da casa e, principalmente, para estar presente na vida de Maria e dona Rosa. “Você acha que somos felizes?”, perguntou Maria de repente.
João a olhou com surpresa. “Você não se sente feliz? Me sinto completa, realizada, em paz.” Maria fez uma pausa, mas às vezes me pergunto se você não sente falta da adrenalina dos grandes negócios, da importância social, do reconhecimento. Maria João segurou seu rosto com gentileza. Você quer saber qual foi o momento mais feliz da minha vida? Qual? Semana passada, quando cheguei em casa e encontrei você na cozinha ensinando dona Rosa a fazer aquele bolo de chocolate que você aprendeu na faculdade. Vocês duas rindo
com farinha no nariz, brigando sobre a quantidade de açúcar. João sorriu com a lembrança. Fiquei uns 10 minutos na porta só observando, pensando: “Meu Deus, eu tenho uma família de verdade.” Os olhos de Maria se encheram de lágrimas. João, durante 40 anos corri atrás de sucessos que não me faziam feliz de verdade.
Agora, aos 42, finalmente entendi o que é felicidade real. É você estudando na mesa da cozinha enquanto eu escrevo no computador ao lado. É passearmos de mãos dadas no mercado do bairro. É dona Rosa me ensinando a fazer pão de açúcar. É dormir abraçado com você todas as noites, sabendo que construímos isso juntos.
Tem certeza de que não vai se cansar dessa vida simples? Maria? Há dois anos, você me fez uma pergunta que nunca esqueci. Perguntou se vai doer, vai ser devagar, caso se entregasse a alguém pela primeira vez. João acariciou seus cabelos, lembra? Maria corou. Lembro.
Na época pensei que você estava falando de intimidade física, mas agora entendo que estava falando de intimidade emocional, de confiança total. E quer saber? Doeu sim. Doeu desconstruir tudo que eu achava que era importante e foi devagar, sim. Foi o processo mais lento e cuidadoso que já vivi. E valeu a pena, valeu cada segundo, porque me ensinou que o amor verdadeiro não é sobre grandes gestos ou paixões avaçaladoras, é sobre escolher a mesma pessoa todos os dias, construir juntos uma vida que faça sentido para ambos e encontrar magia nos momentos simples.
Eles foram interrompidos pelo barulho de um carro chegando. a dona Rosa, que João havia buscado em Belo Horizonte na véspera e agora chegava da padaria com pães frescos para o café da manhã. “Bom dia, pombinhos!”, gritou ela da cozinha. “Cadê todo mundo? O café não se faz sozinho.” Maria e João riram, levantando-se para ajudar. Na cozinha encontraram Rosa já organizando tudo com a eficiência de quem assumira o comando da casa. “Dona Rosa”, disse João beijando a bochecha da senhora.
A senhora está mais animada que nós dois juntos. É porque sou a mais velha e sei aproveitar cada momento bom que a vida oferece. Rosa o cutucou com o cotovelo. E também porque finalmente vou ter netos para criar. Maria quase derrubou a xícara que segurava. Vó, o quê? Vocês acham que sou cega? Dois anos namorando, vivendo praticamente juntos, completamente apaixonados.
Quando vão oficializar essa situação? João e Maria trocaram olhares, ambos corando como adolescentes. “Na verdade”, disse João pigarreando nervoso. “Eu estava pensando em conversar com vocês sobre isso hoje mesmo.” “Conversar sobre o quê?”, perguntou Maria.
João se levantou, foi até a mochila que deixara na sala e voltou com uma pequena caixinha de veludo azul marinho. Sobre isso. Ele se ajoelhou na cozinha simples diante de Maria e dona Rosa. “Maria Guimarães, você quer se casar comigo?” Maria olhou para a caixinha, depois para João, depois para a avó, que batia palmas discretamente, e finalmente de volta para João. “É um anel caro?”, perguntou ela, surpreendendo a ambos. João riu.
Não exageradamente. Escolhi um que fosse bonito, mas não ostensivo. Por quê? Porque se for muito caro, vou vender e usar o dinheiro para nossa lua de mel. E onde você quer passar a lua de mel? Maria olhou pela janela para o lago dourado. Aqui mesmo, porque iríamos para qualquer outro lugar quando já estamos no paraíso? Então é um sim. É um sim gigante, João Andrade.
O beijo que se seguiu foi interrompido pela gargalhada de dona Rosa e pelo barulho de mais carros chegando. Eram os amigos que Maria havia convidado para a celebração, incluindo Lúcia e Carlos, alguns colegas da faculdade, e até Marcos, o antigo assistente de João. O dia se desenrolou em alegria pura.
Ram, contaram histórias, comeram a comida simples, mais saborosa, que prepararam juntos. E quando o sol se pôs sobre o lago, todos se reuniram na varanda para um brinde. A Maria e João, disse dona Rosa, erguendo sua taça de suco de uva, que nos ensinaram que o amor verdadeiro não conhece barreiras de classe, idade ou origem, que nos mostraram que a verdadeira riqueza está nos laços que construímos e no amor que compartilhamos. A Maria e João, repetiram todos.
Mais tarde, quando os convidados haviam partido e dona Rosa se recolhera para o quarto, Maria e João se sentaram na doca, os pés na água morna do lago. “Sabe o que mais me emociona nisso tudo?”, disse Maria, observando as estrelas refletidas na água. “O quê? Que não precisamos mudar nada em nossas vidas para casar.
Não precisamos de festa cara, roupas especiais ou aprovação de ninguém. Já construímos nossa vida juntos. O casamento é só o reconhecimento oficial do que já existe. E o que já existe. Maria se virou para ele, os olhos brilhando com a luz das estrelas. Um amor que cresceu devagar, que foi testado e aprovado, que não depende de grandes gestos para sobreviver.
Um amor que encontrou sua força na simplicidade e sua beleza na verdade. João a puxou para mais perto. Maria, você lembra daquela primeira conversa nossa quando você disse que era uma garçonete do Barreiro e eu era um empresário do centro? Lembro hoje. Entendo que não éramos isso. Éramos duas pessoas perdidas que se encontraram e decidiram construir um caminho juntas. E esse caminho nos trouxe até aqui.
Maria apoiou a cabeça no ombro dele. Até onde exatamente? João sorriu, observando a lua que se levantava sobre as montanhas, até a vida que sempre sonhamos ter, mas nunca soubemos que era possível. E ali na doca rústica de uma casa simples às margens do lago de Furnas, dois corações que haviam encontrado um no outro não apenas o amor, mas a versão mais verdadeira de si mesmos, souberam que haviam descoberto o maior tesouro de todos, uma felicidade que não dependia de nada além do que já eram juntos.
Seis meses depois, casaram-se numa cerimônia simples na Igreja do Rosário, o mesmo lugar onde haviam recomeçado sua história. Maria usava um vestido branco simples, mas elegante. João, um terno azul marinho sem ostentação. Dona Rosa chorou de alegria durante toda a cerimônia. voltaram para Capitólio na mesma tarde, onde passaram a lua de mel, exatamente como Maria havia sonhado, caminhando pela margem do lago, cozinhando juntos, lendo na varanda, descobrindo que a felicidade mais perfeita era aquela que encontravam na companhia um do outro. Um ano depois,
nasceu Helena Rosa Andrade, nome que homenagiava tanto a bisavó quanto a tradição familiar. E quando Maria segurou a filha nos braços pela primeira vez, soube que havia dado à pequena Helena o maior presente possível. Uma família construída sobre amor verdadeiro, respeito mútuo e a certeza de que qualquer sonho é possível quando se tem coragem para lutar por ele.
João, observando sua esposa e filha na casa simples, que se tornara o centro de seu universo, finalmente compreendeu a verdadeira definição de sucesso. Não é o que você conquista, mas o que você constrói. E eles haviam construído algo que nenhum dinheiro do mundo poderia comprar. M.
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