Antes de começarmos, me conta de onde você está assistindo. Comenta aí sua cidade e não esquece de se inscrever no canal e deixar aquele like para fortalecer. Agora sim, vamos à história. A chuva batia nas vidraças da mansão dos Cavalcante com uma insistência que parecia ecoar o vazio dentro do peito de Valentina Ferreira.
Ela estava parada diante da janela do quarto principal, observando as gotas escorrerem pelo vidro como lágrimas silenciosas. Lá fora, o bairro dos jardins dormia sob o manto cinzento da madrugada paulistana, com suas mansões imponentes e seus segredos bem guardados. Valentina tinha apenas 22 anos, mas sentia como se tivesse vivido uma eternidade naqueles seis meses de casamento. Seus dedos finos traçavam círculos no vidro embaçado, enquanto ela tentava lembrar quando foi a última vez que Heitor Cavalcante, seu marido de 35 anos, havia olhado para ela com algo além de cortesia profissional. O casamento havia sido arranjado pelas famílias. Valentina
vinha de uma família tradicional que havia perdido sua fortuna em investimentos malsucedidos. Heitor era o herdeiro do Império Cavalcante, um conglomerado de empresas que dominava o mercado financeiro na Avenida Paulista. A união resolveria os problemas de ambas as partes: dinheiro de um lado, status e respeitabilidade do outro.
“Você ainda está acordada”, a voz de Heitor cortou o silêncio como uma lâmina afiada. Valentina se virou lentamente. Ele estava na porta do quarto, vestindo seu terno Hugo Boss impecável, a gravata Hermés perfeitamente ajustada. Mesmo às 5 da manhã, Heitor Cavalcante parecia pronto para uma reunião de negócios. Seus olhos castanhoescuros e moldurados por cílios espessos, observavam a esposa com aquela expressão neutra que ela havia aprendido a temer mais do que a raiva.
“Não consegui dormir”, respondeu ela, a voz saindo mais fraca do que pretendia. Heitor sentiu brevemente, como se estivesse registrando uma informação irrelevante em seu banco de dados mental. Ele atravessou o quarto com passos medidos, pegou sua pasta de couro legítimo sobre a cômoda de jacarandá e verificou os documentos dentro dela. Tem uma reunião importante hoje. Investidores asiáticos.
Não estarei de volta antes das 11 da noite. Eitor Valentina deu um passo em sua direção, o coração martelando no peito. Podemos conversar só por alguns minutos? Ele pausou, os dedos ainda sobre o fecho da pasta. Por um breve instante, algo tremulou em seu rosto. Uma sombra de emoção, talvez, mas desapareceu tão rápido quanto surgiu.
Sobre o que, Valentina? Sobre nós? Sobre este casamento? Sobre qualquer coisa? As palavras saíram em um jorro desesperado. Você mal me olha, mal conversamos. Eu me sinto como um móvel nesta casa, Heitor. Bonito, caro, mas completamente sem função. O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Heitor fechou a pasta com um clique seco e finalmente se virou para encará-la completamente.
Seus olhos percorreram o rosto dela, os olhos verdes brilhando de lágrimas contidas, as mechas castanho claras caindo sobre os ombros, a camisola de seda que revelava a silhueta delicada. Você tem função”, disse ele a voz baixa e controlada. “É minha esposa.” Representa a família Cavalcante em eventos sociais. Administra esta casa com eficiência.
“Não entendo qual é o problema. O problema é que isso não é um casamento.” A voz de Valentina subiu uma oitava, a frustração finalmente transbordando. É um contrato comercial. Eu não queria isso, Heitor. Eu queria. Eu queria o quê, amor? Ele soltou uma risada curta e amarga.
Valentina, você sabia exatamente no que estava se metendo quando assinou aquela certidão. Nossos pais deixaram tudo muito claro. Não minta para si mesma, achando que havia alguma promessa romântica envolvida. As palavras caíram sobre ela como pedras. Valentina sentiu as lágrimas finalmente escaparem, queimando trilhas quentes em suas bochechas.
Eitor observou por um momento o maxilar tenso e então desviou o olhar. Eu preciso ir, murmurou ele pegando a pasta e caminhando em direção à porta. Um dia você vai se arrepender de me tratar assim, disse Valentina, a voz trêmula, mas firme. Um dia você vai perceber que desperdiçou a chance de ter algo real.
Reitor parou no batente da porta, a mão no trinco. Por um longo momento, ele ficou imóvel, as costas largas, tensas sob o tecido do terno. Valentina prendeu a respiração, esperando, esperando por algo. Qualquer coisa talvez, disse ele finalmente, sem se virar. Mas esse dia não é hoje. E então ele se foi, deixando apenas o eco de seus passos no corredor de mármore Carara e o perfume de sua colônia cara pairando no ar. Valentina se deixou escorregar pela parede até ficar sentada no chão frio.
A manhã cinzenta começava a clarear lá fora, as luzes da cidade se apagando uma a uma. Ela abraçou os joelhos contra o peito e permitiu-se chorar. Não pela primeira vez e certamente não pela última. O que ela não sabia ainda era que naquele exato momento, no outro extremo da mansão, alguém a observava pela fresta da porta entreaberta.
Lorenzo Cavalcante, irmão mais velho de Heitor, apertava os punhos com força, o coração partido pela dor daquela mulher que ele mal conhecia, mas que já havia despertado nele algo que ele não sentia há anos, e essa observação silenciosa mudaria tudo. Três dias se passaram desde aquela manhã tormentosa. Valentina havia estabelecido uma rotina de sobrevivência.
Acordava cedo, tomava café da manhã sozinha na varanda dos fundos, onde o jardim desenhado por Burley Marx oferecia algum consolo visual e passava as tardes na imensa biblioteca da mansão, o único lugar onde se sentia minimamente em paz.
Era quinta-feira à tarde, quando ela descobriu que não estava sozinha em seu refúgio. Valentina havia acabado de pegar um exemplar de grande sertão veredas de Guimarães Rosa quando ouviu uma voz suave atrás de si. Boa escolha. Rosa tem uma maneira única de transformar o sertão em metáfora para a alma humana. Ela se virou bruscamente, quase derrubando o livro. Um homem alto estava apoiado contra uma das estantes de jacarandá, os braços cruzados sobre o peito.
Era mais velho que Heitor, talvez beirando os 40 anos, mas havia uma suavidade em seus traços que o irmão mais novo não possuía. Seus olhos eram do mesmo castanho escuro, mas brilhavam com uma calidez genuína. Ele usava roupas casuais, uma camisa de linho branca e calças de algodão bege. “Você deve ser Lorenzo”, disse Valentina recuperando a compostura. “O irmão de Heitor. E você é Valentina?” Ele sorriu.
E havia algo no sorriso que a fez sentir pela primeira vez em meses que alguém realmente a via. Desculpe invadir seu espaço. Vim visitar meu irmão, mas a dona Célia me disse que ele só volta à noite. Pensei em esperar aqui. Não está invadindo nada. Valentina gesticulou para as poltronas de couro próximas à lareira apagada.
Esta biblioteca é grande demais para uma pessoa só. Por favor, fique à vontade. Lorenzo se aproximou com passos tranquilos e se sentou em uma das poltronas, observando-a com curiosidade genuína enquanto ela se acomodava na poltrona oposta. O livro de Guimarães Rosa permaneceu em suas mãos como um escudo. Eitor me falou muito pouco sobre você, disse Lorenzo após um momento. Mas dona Célia é mais comunicativa.
Ela diz que você passa horas aqui lendo. É meu escape. Valentina abriu o livro, mas não conseguiu focar nas palavras. Na literatura posso viver mil vidas diferentes. Posso ser qualquer pessoa, estar em qualquer lugar, menos você mesma aqui e agora. A observação foi dita com delicadeza, mas acertou como uma flecha certeira.
Valentina ergueu os olhos e encontrou o olhar de Lorenzo fixo nela, penetrante, mas não invasivo. Havia compreensão naqueles olhos e algo mais que ela não conseguia decifrar. “Desculpe”, disse ele rapidamente, percebendo que havia tocado em uma ferida sensível. “Não era minha intenção ser intrometido. É uma mania minha analisar as pessoas. Você trabalha com psicologia? Não, exatamente. Sou diretor da Fundação Cavalcante.
Trabalhamos com projetos sociais, principalmente alfabetização na zona leste. Lorenzo se inclinou levemente para a frente, os cotovelos apoiados nos joelhos. Você acaba desenvolvendo uma certa sensibilidade para ler as pessoas quando trabalha com comunidades vulneráveis. Deve ser um trabalho gratificante. Valentina sentiu uma pontada de inveja.
Fazer algo que realmente importa. E o que você faz não importa. Eu não faço nada. As palavras saíram amargas. Sou esposa decorativa de um empresário bem-sucedido. Organizo jantares, sorrio para fotógrafos, uso vestidos caros. Minha existência é completamente supérflua. Lorenzo ficou em silêncio por um longo momento, estudando-a.
Valentina sentiu-se exposta sobr, mas estranhamente não se importou. Era diferente da maneira como Heitor a olhava, como se ela fosse uma aquisição, um ativo em seu portfólio. Lorenzo a olhava como se ela fosse. Interessante. Você estudou na USP, certo? Perguntou ele de repente. Letras. Comecei, não terminei. Valentina fechou o livro com força. O casamento aconteceu no meio do curso.
Heitor achou que eu não precisava mais estudar. E você concordeou? Eu não tive escolha. Todos nós temos escolhas, Valentina. A voz de Lorenzo era suave, mas firme. Às vezes são escolhas difíceis, com consequências desagradáveis, mas ainda assim são escolhas. Valentina sentiu a raiva ferver em seu peito.
Quem era aquele homem para vir até ela? Um completo estranho e fazer essas observações sobre sua vida? Você não sabe nada sobre mim, rebateu ela, ficando de pé. Não sabe o que minha família passou, as dívidas, a humilhação. Não sabe o que era ver minha mãe chorando todas as noites porque íamos perder tudo. Então, não venha me dizer que eu tive escolha. Lorenzo também se levantou, as mãos erguidas em um gesto apaziguador. Você tem razão.
Foi insensível da minha parte. Ele deu um passo em sua direção, os olhos suplicantes. Por favor, aceite minhas desculpas. Eu realmente não tenho o direito de julgar suas decisões. A sinceridade na voz dele desarmou a defesa de Valentina. Ela suspirou profundamente, passando as mãos pelo rosto. Não, eu é que peço desculpas.
Não deveria ter explodido assim. Ela se sentou novamente, de repente exausta. É que tem sido difícil, muito difícil. Lorenzo voltou para sua poltrona, mas desta vez havia uma nova proximidade entre eles, não física, mas emocional, como se naqueles poucos minutos de conversa honesta tivessem atravessado uma barreira invisível.
“Eitor sempre foi assim”, disse Lorenzo, a voz carregada de uma tristeza antiga, fechado, focado em negócios, incapaz de se conectar emocionalmente. “Nosso pai era igual.” Transformou Heitor em uma versão jovem de si mesmo. E você? perguntou Valentina curiosa. Como escapou dessa programação? Um sorriso melancólico tocou os lábios de Lorenzo.
Eu era o primogênito. Era para eu assumir os negócios da família. Mas quando tinha 25 anos, me apaixonei por uma professora que trabalhava em uma escola comunitária. Ela me mostrou que havia um mundo além das planilhas da B3 e dos balanços trimestrais. Ele pausou, os olhos distantes. Meu pai nunca me perdoou por escolher a fundação em vez da empresa. Heitor assumiu meu lugar.
O que aconteceu com a professora? Nós terminamos. Ela percebeu que no fundo eu ainda carregava muito do peso da família cavalcante. Não era justo com ela. Lorenzo voltou seu olhar para Valentina e havia uma intensidade ali que fez o coração dela acelerar.
Mas ela me ensinou algo importante que é possível escolher diferente, mesmo quando parece impossível. Valentina abriu a boca para responder, mas naquele momento a porta da biblioteca se abriu com força. Heitor entrou, a gravata afrouxada e uma expressão tensa no rosto. Seu olhar foi de Lorenzo para Valentina e algo perigoso brilhou em seus olhos. Lorenzo não sabia que estava aqui. Vim te ver.
Lorenzo se levantou calmamente as mãos nos bolsos. Mas você estava trabalhando, então fiquei conversando com sua esposa. Ela tem excelente gosto literário. Heitor se aproximou, colocando-se entre os dois de uma maneira que Valentina reconheceu como territorial. Que bom que se divertiram. Mas agora preciso falar com Lorenzo em particular.
Valentina, pode nos dar licença? Não era um pedido, era uma ordem. Valentina pegou o livro que havia deixado na mesinha lateral e caminhou em direção à porta, sentindo os olhos de ambos os irmãos em suas costas. Quando chegou ao batente, não resistiu e olhou para trás. Lorenzo a observa com uma expressão que ela não conseguiu decifrar completamente, mas que fez algo se mexer dentro de seu peito.
“Foi um prazer conhecê-la, Valentina”, disse ele. E havia tanto peso naquelas palavras simples que ela soube com absoluta certeza que aquele encontro havia mudado algo fundamental e ela estava certa. Mas o que mudou era algo que nenhum dos três estava preparado para enfrentar.
Duas semanas se passaram desde aquela tarde na biblioteca, mas Valentina não conseguia tirar Lorenzo de sua mente. Ela se pegava pensando nas conversas que haviam tido, na maneira como ele realmente a escutava, como se suas palavras importassem. Era tão diferente de Heitor que mal levantava os olhos do laptop quando ela falava. Lorenzo havia voltado à mansão algumas vezes desde então, sempre com alguma desculpa, trazer documentos da fundação para Eitor assinar, discutir assuntos familiares, verificar um problema no sistema de irrigação do jardim.
Mas Valentina sabia, com aquela intuição feminina que raramente erra, que as visitas eram por causa dela, e ela, Deus a perdoasse, esperava ansiosamente por cada uma delas. Era uma noite de sexta-feira. Heitor havia viajado para o sul do Brasil para reuniões com investidores e não voltaria antes de domingo.
Valentina estava na varanda dos fundos, observando o IP amarelo que dominava o centro do jardim. Suas flores douradas brilhavam sob a luz suave dos postes de iluminação, criando uma cena quase mágica. É bonito, não é? Valentina se virou tão rapidamente que quase derrubou a xícara de café coado que segurava.
Lorenzo estava parado na porta francesa que levava a varanda vestindo uma camisa polo azul marinho e jeans escuros. Ele parecia mais jovem assim, mais relaxado. “Lorenzo!” Ela pressionou a mão contra o peito, sentindo o coração disparado. Você me assustou. Não sabia que estava aqui. Desculpe. Dona Célia me deixou entrar. Ele se aproximou devagar, como se estivesse com medo de assustá-la novamente.
Trouxe alguns documentos que Heitor pediu. Ela me disse que ele viajou. Voltou domingo. Ah! Um silêncio constrangido se instalou entre eles. Lorenzo colocou as mãos nos bolsos, observando o jardim com uma intensidade forçada. Valentina notou a tensão em seus ombros, a maneira como sua mandíbula estava cerrada. “Você quer um café?”, ofereceu ela erguendo a xícara.
Dona Célia acabou de fazer do jeito tradicional bem forte. Por favor. Valentina foi até a mesinha de vidro, onde repousava a garrafa térmica, e serviu uma xícara para Lorenzo. Quando estendeu a xícara para ele, seus dedos se tocaram brevemente e foi como se uma corrente elétrica passasse entre eles.
Os olhos de Lorenzo se arregalaram levemente e Valentina soube que ele havia sentido também. Valentina, começou ele, a voz rouca. Não. Ela se afastou rapidamente, abraçando a própria xícara como se fosse uma âncora. Por favor, não diga nada que não possamos retirar depois. Lorenzo deu um passo em sua direção, os olhos escuros brilhando com uma emoção intensa.
E se eu não quiser retirar? E se eu precisar dizer mesmo que mude tudo? Lorenzo, você sabe que isso é errado. Valentina sentia as lágrimas queimarem em seus olhos. Eu sou casada com seu irmão. Um casamento sem amor. A voz dele subiu desesperada. Você acha que eu não vejo? Você acha que não percebo como ele te trata? Como se você fosse uma obrigação em vez de uma dádiva? Mas ainda assim é um casamento.
Valentina colocou a xícara sobre a mesa com mãos trêmulas. E você é o irmão dele. Não podemos. Nós não devemos. Eu sei. Lorenzo passou as mãos pelo cabelo escuro, a frustração evidente em cada linha de seu corpo. Eu sei disso, Valentina. Você acha que eu não tenho lutado contra isso? Você acha que eu não tenho me odiado por sentir o que sinto? O que você sente? As palavras saíram em um sussurro, mas ecoaram no silêncio da noite como um grito.
Lorenzo a encarou e Valentina viu a verdade crua e nua em seus olhos antes mesmo dele falar. Eu estou apaixonado por você. Ele deu mais um passo, fechando a distância entre eles. Desde aquele primeiro dia na biblioteca, quando você falou sobre viver mil vidas através dos livros, desde que via a tristeza em seus olhos e quis desesperadamente ser capaz de tirá-la de lá. Lorenzo, pare. Mas a voz de Valentina saiu fraca, sem convicção.
Eu tento. Deus sabe que eu tento. Ele estava tão perto agora que ela podia sentir o calor emanando de seu corpo, o cheiro de sua colônia amadeirada. Eu fico longe, eu evito vir aqui. Eu me obrigo a pensar em outras coisas, mas então eu te vejo e tudo desmorona. Cada vez que Heitor fala de você como se fosse um objeto, como se fosse algo que ele possui, mas não valoriza, eu quero sacudi-lo e gritar que ele não sabe a joia que tem. As lágrimas finalmente escorreram pelo rosto de Valentina.
Ela queria correr, queria se afastar, queria fazer a coisa certa, mas seus pés pareciam enraizados no chão de madeira da varanda e seu coração batia tão forte que ela tinha certeza de que Lorenzo podia ouvi-lo. “Por que está me dizendo isso?”, sussurrou ela. Porque está tornando tudo mais difícil.
Porque eu não posso mais fingir? Lorenzo ergueu a mão lentamente, como se estivesse se aproximando de um animal assustado, e tocou o rosto dela com a ponta dos dedos. O toque foi tão suave, tão reverente, que Valentina sentiu um soluço subir em sua garganta. Porque você merece saber que existe alguém que te vê, que te valoriza, que daria qualquer coisa para fazer você sorrir de verdade. Isso não muda nada.
disse Valentina, mas suas próprias mãos traíram suas palavras, subindo para segurar o pulso dele, mantendo aquele toque precioso contra seu rosto. “Eu ainda sou casada, ainda sou a esposa de Heitor. Eu sei.” Lorenzo inclinou a testa contra a dela, fechando os olhos. E é por isso que eu vou embora.
É por isso que depois desta noite vou manter distância, porque apesar de tudo que sinto, eu não vou ser o homem que destrói o casamento do meu irmão. Não importa quão vazio esse casamento seja, Lorenzo, mas eu precisava que você soubesse. Ele se afastou lentamente e a ausência de seu toque pareceu um frio doloroso.
Precisava que você soubesse que merece mais, que merece ser amada da maneira que eu, da maneira que alguém deveria amar você. Ele recuou mais um passo, depois outro, os olhos ainda fixos nela, como se estivesse tentando memorizar cada detalhe de seu rosto. Valentina ficou paralisada, observando-o se afastar, sentindo algo se partir dentro dela.
“Adeus, Valentina!” A voz dele estava carregada de dor. Cuide-se! E então ele se virou e caminhou de volta para dentro da casa, deixando-a sozinha na varanda com o perfume das flores do campo no ar e lágrimas salgadas em seus lábios. Valentina se deixou cair em uma das cadeiras de vime, abraçando os joelhos contra o peito.
A noite parecia ter esfriado de repente e o IP amarelo, que antes parecia mágico, agora apenas destacava sua solidão. Ela sabia que deveria estar aliviada. Lorenzo havia feito a coisa certa. havia reconhecido os limites e prometido respeitá-los. Ela deveria estar grata por isso. Mas tudo que sentia era um vazio imenso, como se algo precioso tivesse acabado de escorregar por entre seus dedos e sem que ela soubesse.
Na janela do segundo andar, dona Célia observava a cena com o coração apertado, perguntando-se o que aquele amor impossível traria para todos eles. Três semanas se passaram desde aquela noite na varanda. Lorenzo havia cumprido sua promessa. Não aparecera mais na mansão, não enviara mensagens, não dera nenhum sinal de vida.
Heitor havia comentado casualmente que o irmão estava envolvido em um novo projeto de alfabetização na zona leste e mal tinha tempo para reuniões familiares. Valentina deveria estar aliviada, mas a ausência de Lorenzo era como um buraco negro que sugava toda a luz de sua vida. Ela se pegava, olhando para a porta da biblioteca, esperando vê-lo surgir.
Acordava no meio da noite com o coração acelerado, lembrando do toque dele em seu rosto, das palavras que ele havia dito: “Eu estou apaixonado por você”. Aquelas palavras ecoavam em sua mente incessantemente, tornando impossível focar em qualquer outra coisa. Foi em uma manhã de terça-feira que tudo mudou.
Valentina acordou com uma náusea violenta. Ela mal conseguiu chegar ao banheiro antes de vomitar, agarrando-se à borda do vaso sanitário enquanto seu estômago se revirava. Quando finalmente conseguiu se levantar, trêmula e pálida, encontrou Heitor parado na porta do banheiro, agravata pela metade, a expressão preocupada. “Você está bem?”, perguntou ele.
E havia uma nota genuína de preocupação em sua voz que Valentina não ouvia há meses. “Deve ter sido algo que comi”, murmurou ela, lavando o rosto na pia. “Vou ficar bem”, mas não ficou. A náuseia voltou no dia seguinte e no outro, sempre pela manhã. Dona Célia, com sua sabedoria de mulher mais velha, sugeriu discretamente que Valentina fizesse um teste de gravidez.
O teste foi positivo. Valentina ficou sentada no banheiro por quase uma hora, encarando as duas linhas cor-de-rosa no bastão de teste. Um bebê. Ela estava grávida. Grávida de Heitor. A ironia da situação não passou despercebida. Ela havia passado seis meses dividindo uma cama com um homem que mal a tocava.
E nas raras vezes que haviam sido íntimos, havia sido algo mecânico, sem paixão, e agora estava carregando o filho dele. E o pior, a parte que a fazia sentir uma culpa esmagadora era que tudo que conseguia pensar era em Lorenzo, em como seria diferente se o bebê fosse dele, se ela pudesse compartilhar essa notícia com alguém que realmente se importava com ela.
Ela sabia que precisava contar a Heitor, mas não sabia como, não sabia o que esperar. Ele ficaria feliz, indiferente, irritado com essa complicação em sua vida perfeitamente ordenada. Valentina escolheu a noite de sexta-feira. Heitor havia voltado relativamente cedo do escritório, apenas às 9, em vez das habituais 11. Ela o esperou no escritório particular dele, sentada em uma das poltronas de couro, as mãos entrelaçadas no colo para impedir que tremessem.
Quando o Heitor entrou, tirou o palitó do terno e o pendurou cuidadosamente no cabide de Mógno atrás da porta. Só então ele notou a presença dela. Valentina. Ele franziu a testa. Aconteceu algo? Precisamos conversar. Algo na voz dela deve ter transmitido a gravidade da situação. Porque Heitor se aproximou imediatamente, puxando a outra poltrona para ficar de frente para ela.
O que foi? Sua família está bem? Não é sobre minha família. Valentina respirou fundo, forçando-se a manter contato visual. É sobre nós, sobre o futuro. Está me assustando. Eu estou grávida. O silêncio que se seguiu foi absoluto. Heitor ficou completamente imóvel, os olhos arregalados, o rosto pálido sob a luz amarelada do abajur.
Valentina observou uma sequência de emoções, passando por suas feições, choque, confusão e, então, algo que ela não conseguia identificar. “Tem certeza?”, perguntou ele finalmente, a voz saindo rouca. Fiz três testes, todos positivos. Valentina tocou instintivamente a barriga ainda lisa.
Marquei um ultrassom para a semana que vem para confirmar, mas sim, tenho certeza. Heitor se levantou abruptamente, caminhando até a janela. Ficou ali parado, as mãos nos bolsos, as costas rígidas. Valentina observou a tensão em seus ombros, o jeito como seu peito subia e descia com respirações controladas. Eitor, chamou ela suavemente. Diga alguma coisa.
O que você quer que eu diga? Ele se virou e havia uma vulnerabilidade em seus olhos que Valentina nunca tinha visto antes. Que estou feliz, que estou pronto para ser pai. Eu não sei o que sentir, Valentina. Eu não sei como fazer isso. Fazer o quê? Isso. Ele gesticulou entre os dois. Ser um marido de verdade? Ser um pai. Eu não tive exemplo disso. Meu pai era frio, distante, focado apenas nos negócios, transformou seus filhos em projetos corporativos.
Ele passou a mão pelo cabelo, desarrumando-o pela primeira vez desde que Valentina o conhecia. E eu me tornei exatamente como ele. Eu trato você como trato meus investimentos, com eficiência, mas sem emoção. Valentina se levantou lentamente, surpresa com a honestidade crua na voz dele. “Então mude”, disse ela suavemente. “Você não precisa ser seu pai. Você pode escolher ser diferente. Posso?” Heitor a encarou.
E havia tanto medo em seus olhos que o coração de Valentina se apertou. “E se eu for incapaz? E se eu arruinar tudo? Como arruinei nosso casamento. Você não arruinou tudo sozinho. Valentina se aproximou dele, parando a meio metro de distância. Eu também participei desse fracasso. Eu aceitei essa dinâmica.
Eu parei de lutar. Mas você não deveria ter que lutar. A voz de Heitor estava carregada de autoflagelação. O marido deveria fazer sua esposa se sentir amada, valorizada. E eu fiz você se sentir invisível, Heitor. Eu vejo, sabe? Ele continuou, as palavras saindo em um jorro agora.
Eu vejo a maneira como você olha pela janela todas as manhãs, como se estivesse presa. Vejo como você passa horas na biblioteca, porque é o único lugar onde pode esquecer que está infeliz. Vejo Valentina, mas não sei como consertar. As lágrimas correram livremente pelo rosto de Valentina. Agora, ouvir finalmente expressar consciência do sofrimento dela era ao mesmo tempo libertador e doloroso.
“Nós podemos aprender”, disse ela, a voz trêmula. “Juntos por esse bebê, podemos tentar construir algo real”. Heitor a observou por um longo momento e então, pela primeira vez desde que se casaram, ele deu um passo à frente e a abraçou. Foi um abraço hesitante, desajeitado, como se ele não soubesse bem onde colocar as mãos. Mas era real, era genuíno.
Valentina se permitiu relaxar contra ele, sentindo o calor de seu corpo, os batimentos acelerados de seu coração. E, por um breve momento, ela se permitiu imaginar que talvez, apenas talvez eles pudessem fazer isso funcionar. Mas em sua mente, a imagem de Lorenzo ainda brilhava, uma chama que ela não conseguia apagar, não importa o quanto tentasse.
Os dois meses seguintes trouxeram mudanças sutis, mas significativas na dinâmica entre Valentina e Eitor. Ele começou a chegar mais cedo em casa, às 8, às vezes até às 7. Jantavam juntos, conversavam sobre o dia dela, sobre como ela estava se sentindo. Heitor até a acompanhou ao primeiro ultrassom, onde ouviram juntos o batimento cardíaco acelerado de seu bebê.
“Oito semanas”, disse a médica apontando para o pequeno ponto pulsante na tela. “Está tudo bem com o bebê? Batimentos cardíacos fortes e irregulares. Valentina observou o rosto de Heitor enquanto ele encarava a tela e viu algo amolecer em sua expressão. Seus dedos apertaram-os dela com uma força que beirava o doloroso, mas ela não reclamou.
Era progresso, mas apesar das mudanças, apesar dos esforços genuínos de Heitor, Valentina não conseguia tirar Lorenzo de sua mente. Ela sabia que era errado. Sabia que estava sendo injusta com Heitor, que realmente estava tentando, mas o coração não obedece a lógica. Ela se pegava, imaginando como seria se Lorenzo soubesse da gravidez, o que ele diria, como reagiria.
Ele estaria feliz por ela, triste? Ambos? As respostas vieram de uma forma que ela nunca esperou. Era uma tarde chuvosa de quinta-feira. Valentina estava na sala de estar folando uma revista de decoração infantil quando dona Célia anunciou uma visita. Senr. Lorenzo, está aqui, senhora. O coração de Valentina parou, depois disparou em uma velocidade alarmante.
Ela passou as mãos instintivamente pela barriga de seis meses, já visivelmente arredondada, e então pelo cabelo, tentando se recompor. Pode, pode mandá-lo entrar. Lorenzo apareceu na porta da sala e Valentina ficou sem ar. Ele parecia diferente, mais magro, o rosto marcado por linhas que não estavam lá antes, mas seus olhos ainda eram os mesmos.
aquele castanho escuro que parecia enxergar direto na alma dela. Os olhos dele foram direto para a barriga dela. Ele ficou paralisado, o sangue drenando de seu rosto. “Você está Você está grávida?” Não era uma pergunta, era uma constatação dita em um tom de voz que misturava choque, dor e algo mais profundo que Valentina não conseguiu identificar.
“De seis meses”, confirmou ela, a voz saindo mais calma do que sentia. Descobri logo depois que você, depois da última vez que nos vimos, Lorenzo entrou lentamente na sala, como se estivesse em trans. Ele se sentou pesadamente em uma das poltronas, os olhos ainda fixos na barriga dela. É por isso que você não respondeu minhas mensagens. Que mensagens? Eu mandei três mensagens para você.
Lorenzo finalmente ergueu os olhos para o rosto dela, perguntando como você estava, dizendo que eu estava pensando em você, que eu sentia a sua falta. Eu nunca recebi nenhuma mensagem. A realização veio lenta, mas certeira. Eitor, Heitor devia ter interceptado as mensagens de alguma forma, mudado seu número, bloqueado Lorenzo, ela não sabia, mas não seria surpreendente. Então, Heitor, Lorenzo não terminou a frase, mas não precisou.
Ele não sabe sobre sobre nós. Valentina se sentou ao lado dele, mantendo uma distância respeitável. Não há um nós, Lorenzo. Nunca houve. Não houve? A voz dele estava carregada de emoção contida. Então, como você explica o fato de eu não ter conseguido parar de pensar em você por um único dia? Como explica que eu acordo no meio da noite, lembrando de cada palavra que trocamos, cada olhar? Lorenzo, por favor. Valentina sentiu as lágrimas queimar em seus olhos.
Não torne isso mais difícil. Eu estou grávida do Heitor. Estou tentando fazer esse casamento funcionar por mim, pelo bebê, por todos nós. E está funcionando? Lorenzo se inclinou para a frente, os olhos penetrantes. Você é feliz, Valentina? Realmente feliz? A verdade deve ter sido evidente em seu rosto, porque Lorenzo fechou os olhos e suspirou profundamente.
Eu deveria ter lutado por você. disse ele, abrindo os olhos novamente. Naquela noite na varanda eu deveria ter sido egoísta. Deveria terte pedido para vir comigo, não importa as consequências. E o que teríamos agora? Valentina deixou as lágrimas correrem livremente. Você teria destruído seu relacionamento com o Heitor.
Minha família teria perdido o apoio financeiro dos Cavalcante. Eu teria sido vista como como uma mulher sem moral. E para quê? para um amor que pode nem ter futuro, mas teria valido a pena tentar. O silêncio que se seguiu foi pesado, carregado de todos os sis e más que paivam entre eles.
“Por que você está aqui, Lorenzo?”, perguntou Valentina finalmente, limpando as lágrimas com as costas da mão. Depois de dois meses sem dar notícias, por que apareceu agora? “Porque Eitor me ligou ontem?” Lorenzo se levantou, caminhando até a janela. Ele quer que eu seja o padrinho do bebê. Valentina sentiu como se tivesse levado um soco no estômago.
Ele, ele o quê? Disse que apesar de tudo, eu sou família, que ele quer que o filho dele cresça conhecendo o tio, que quer consertar nossa relação. Lorenzo riu, mas não havia humor no som. A ironia não passou despercebida. Ele está me pedindo para ser padrinho do filho dele com a mulher que eu amo. Lorenzo, você não pode. Eu já aceitei.
Valentina se levantou de um salto, ou pelo menos tentou. O peso extra da gravidez tornou o movimento desajeitado. Por quê? Por que você faria isso? Lorenzo se virou para encará-la e havia uma determinação feroz em seus olhos. Porque se eu não posso ter você como esposa, então vou garantir que estarei presente na sua vida de alguma forma.
Ele deu um passo em sua direção. Porque vou proteger você e esse bebê, mesmo que de longe, porque não importa o quanto doa, você é parte da minha família agora e eu não abandono minha família. Isso vai ser uma tortura para você, para nós dois. Eu sei. Lorenzo estava tão perto agora que Valentina podia ver as manchas douradas em seus olhos castanhos.
Mas eu prefiro a tortura de estar perto de você do que o vazio de estar longe. Valentina abriu a boca para responder, mas antes que pudesse formar as palavras, uma dor aguda atravessou seu abdômen. Ela arqueou para a frente com um grito, as mãos voando para a barriga. Valentina. Lorenzo assegurou pelos ombros.
O que foi? O que está acontecendo? Dor”, ela conseguiu dizer entre os dentes cerrados. Algo está errado. E então ela sentiu a umidade quente escorrendo por suas pernas. Quando olhou para baixo, viu o sangue manchando o seu vestido branco. “Não, não, não.” Ela sentiu o pânico subir, ameaçando sufocá-la. “O bebê, meu bebê, eu vou te levar ao hospital agora”.
Lorenzo a levantou nos braços, como se ela não pesasse nada, gritando para dona Célia: “Chame uma ambulância”. e ligue para Eitor. Enquanto Lorenzo a carregava para fora da mansão, Valentina sentiu o mundo começar a girar. A dor era insuportável e o medo era ainda pior. Ela agarrou a camisa de Lorenzo, enterrando o rosto em seu peito. “Não deixe meu bebê morrer”, implorou ela, a voz quebrada. “Por favor, Lorenzo, não deixe.
Eu não vou deixar.” A voz dele estava firme, determinada, mesmo enquanto ela podia sentir seu coração batendo descontroladamente contra o ouvido dela. “Você e esse bebê vão ficar bem, eu prometo.” Mas enquanto a ambulância cortava o trânsito de São Paulo em direção ao sírio libanês, com as sirenees uivando e Valentina perdendo mais e mais sangue, Lorenzo se perguntava se aquela era uma promessa que ele poderia cumprir.
O hospital sírio libanês era um borrão de luzes brancas e vozes urgentes. Valentina mal registrava o que estava acontecendo. As mãos de Lorenzo segurando-as dela, a maca correndo pelos corredores, os médicos falando em termos médicos que ela não compreendia. Descolamento de placenta, possível hemorragia. Precisamos estabilizar.
As palavras flutuavam ao redor dela como pássaros assustados, impossíveis de capturar. Tudo que ela conseguia pensar era no bebê. Seu bebê, que ainda não tinha visto, não tinha segurado, não tinha tido chance de amar adequadamente. Lorenzo, ela apertou a mão dele com força, quando os médicos tentaram separá-los. Não me deixe sozinha. Eu não vou a lugar nenhum. Ele beijou seus dedos rapidamente, os olhos brilhando com lágrimas contidas.
Vou estar esperando bem aqui quando você sair, eu prometo. E então eles a levaram e Lorenzo desapareceu de sua visão. O procedimento foi um pesadelo. Os médicos conseguiram estabilizar a placenta, mas Valentina precisaria de repouso absoluto pelo resto da gravidez. O bebê estava em risco.
Qualquer estresse, qualquer movimento errado poderia causar outro descolamento. Quando Valentina finalmente acordou da sedação, a primeira coisa que viu foi Eitor. Ele estava sentado na cadeira ao lado da cama do hospital, a gravata desfeita, o cabelo desarrumado, os olhos vermelhos como se tivesse estado chorando.
Quando ele percebeu que ela estava acordada, se levantou de um salto. Valentina, graças a Deus. Ele pegou a mão dela, apertando-a com força. Você me assustou muito. O bebê? A voz dela saiu rouca, arranhada. Como está o bebê? Está bem por enquanto. Heitor se sentou na beira da cama e Valentina podia ver as mãos dele tremendo. Mas os médicos disseram que foi por pouco.
Se Lorenzo não tivesse te trazido tão rápido, se você tivesse esperado mais alguns minutos, ele não terminou a frase, mas não precisou. Valentina sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Onde ele está, Lorenzo? Algo passou pelo rosto de Heitor. Uma emoção que Valentina não conseguiu identificar completamente. Ciúme? Gratidão. Ambos na sala de espera. Ele está aqui desde que vocês chegaram. Não quis ir embora.
Heitor fez uma pausa, olhando fixamente para as mãos entrelaçadas deles. Ele salvou sua vida, Valentina. A vida do nosso bebê. Eu sei. Eitor levantou os olhos para ela e havia uma vulnerabilidade crua ali que ela nunca tinha visto antes. Eu quase perdi vocês. Sua voz quebrou na última palavra. Eu estava em uma reunião estúpida sobre fusões e aquisições, discutindo números em planilhas.
E você estava aqui sangrando, lutando pela vida do nosso filho. E eu não estava lá. Não estava lá quando você precisou de mim, Heitor. Não. Ele balançou a cabeça com força. Deixa eu falar. Eu preciso falar. Ele respirou fundo, como se estivesse se preparando para mergulhar em águas profundas.
Quando Lorenzo ligou, quando ele disse o que tinha acontecido, eu senti como se o chão tivesse desaparecido sob meus pés. Eu pensei em todas as vezes, que cheguei tarde em casa, todas as conversas que cortei porque tinha trabalho a fazer, todas as formas como te fiz sentir que você não era importante. As lágrimas começaram a correr pelo rosto de Valentina.
E então eu pensei: “E se eu a perder? E se eu perder nosso bebê? E se eu nunca tiver a chance de mostrar a ela quem eu realmente posso ser?” Eitor levou a mão dela até os lábios, beijando seus dedos. Eu não quero ser meu pai, Valentina. Não quero ser o homem frio e distante que coloca trabalho acima de família.
Eu quero mudar. Quero ser melhor para você, para nosso bebê. Você não precisa passar por uma tragédia para perceber isso”, disse Valentina suavemente. “Você sempre teve essa escolha. Eu sei. E eu escolhi errado, repetidamente. Ele limpou as próprias lágrimas com a mão livre, um gesto surpreendentemente vulnerável. Mas eu estou escolhendo diferente agora.
Eu falei com meus sócios. Vou reduzir minha carga de trabalho. Vou delegar mais. Vou estar presente, Valentina. Não apenas fisicamente, mas realmente presente. Valentina queria acreditar nele. Queria desesperadamente acreditar que pessoas podiam mudar, que quase perder algo precioso podia transformar alguém.
Mas havia uma parte dela, a parte que ainda guardava as palavras de Lorenzo em seu coração, que se perguntava se seria suficiente. “Nós vamos fazer isso funcionar”, disse Heitor, interpretando seu silêncio como dúvida. “Eu vou provar para você. Não com palavras, mas com ações.
Todos os dias eu vou provar que você fez a escolha certa em me dar essa chance. Antes que Valentina pudesse responder, houve uma batida leve na porta. Lorenzo entrou carregando dois copos de café. Quando viu Valentina acordada, seu rosto inteiro se iluminou com alívio. “Você está bem?”, disse ele. E havia tanto sentimento naquelas três palavras que Valentina sentiu seu coração apertar. Graças a Deus.
“Graças a você. Corrigiu Heitor, levantando-se. Lorenzo, eu eu não sei como agradecer. Você salvou minha família. Lorenzo entregou um dos cafés para Eitor, seus olhos brevemente encontrando os de Valentina antes de desviar. Qualquer um teria feito o mesmo. Não, não teria. Eitor colocou a mão no ombro do irmão, apertando: “Você estava lá quando eu não estava.
Você agiu quando eu teria hesitado. Você Você Você Você é um homem melhor do que eu, irmão. O desconforto no rosto de Lorenzo era palpável. Ele deu um passo para trás, afastando-se do toque de Heitor. Eu vou vou deixar vocês sozinhos. Ele olhou para Valentina e ela viu um mundo de emoções não ditas em seus olhos. Cuide-se e do bebê. Lorenzo.
Espera chamou Heitor quando o irmão já estava virando para sair. Nós vamos batizar o bebê. em três meses, quando tudo estiver estável. E eu gostaria, nós gostaríamos que você fosse o padrinho. Valentina viu a dor passar pelo rosto de Lorenzo, rápida, mas inconfundível. Eitor, eu não acho, por favor. E agora era Eitor quem tinha vulnerabilidade na voz. Você é meu irmão, meu único irmão.
E apesar de termos nos afastado nos últimos anos, você ainda é família. Eu quero que meu filho cresça conhecendo você. Quero que ele tenha o que nós não tivemos, um tio presente que realmente se importa. Lorenzo olhou de Heitor para Valentina, claramente em conflito. Valentina queria dizer não, queria poupar os dois daquela tortura.
Mas era Heitor quem estava falando. Heitor que estava estendendo esse ramo de oliveira para o irmão, completamente alheio ao fato de que ele estava pedindo ao homem que amava sua esposa para ser padrinho de seu filho. “Si assim”, disse Lorenzo finalmente, a voz rouca, “Eu seria honrado”. Eitor sorriu genuinamente feliz e abraçou o irmão.
Por cima do ombro de Eitor, os olhos de Lorenzo encontraram os de Valentina e naquele olhar ela viu promessas silenciosas de proteção, de presença, de um amor que seria guardado, mas nunca esquecido. E enquanto os três existiam naquele momento de unidade familiar falsa, cada um deles carregava segredos que ameaçavam explodir tudo em pedaços.
Os três meses seguintes foram uma montanha russa de emoções e mudanças. Valentina passou as primeiras seis semanas em repouso absoluto, confinada à cama, observando o mundo através da janela do quarto. Heitor, fiel à sua palavra, reduziu drasticamente sua carga de trabalho. Ele trabalhava de casa duas vezes por semana, almoçava com ela todos os dias e à noite lia em voz alta para a barriga dela.
Lorenzo manteve distância respeitosa, mas presença constante. Ele ligava semanalmente para verificar como ela estava, sempre com Heitor presente. Visitava quinzenalmente, trazendo livros que achava que ela gostaria, flores do jardim da fundação, histórias sobre os projetos na zona leste. Era um equilíbrio delicado, frágil como cristal, e Valentina vivia com medo de que um movimento errado pudesse quebrá-lo.
Quando Valentina finalmente entrou no oitavo mês de gravidez, os médicos deram luz verde para que ela retomasse atividades normais com moderação. Foi um alívio imenso poder sair da cama, andar pelo jardim, sentir o sol em seu rosto novamente. Era uma manhã de sábado quando ela teve a primeira contração. Estava no jardim, admirando as flores que Burley Marx havia plantado décadas atrás, quando sentiu um aperto familiar no baixo ventre.
Não era dor ainda não, mas era definitivamente diferente das contrações de Braxton Hicks que vinha sentindo nas últimas semanas. Heitor, chamou ela, voltando para dentro da casa com passos apressados. Acho que está na hora. O que se seguiu foi um caos organizado. Heitor correu como um louco pela casa, procurando a mala que haviam preparado. Dona Célia ligou para o sírio libanês, avisando que estavam a caminho.
E Eitor, em um momento de clareza surpreendente, ligou para Lorenzo. Ela está entrando em trabalho de parto. Vamos para o hospital agora. Você Você Você pode vir? Valentina não ouviu a resposta de Lorenzo, mas pelo modo como o Heitor relaxou, soube que ele viria. O trabalho de parto foi longo, 14 horas de contrações progressivamente mais fortes, de médicos monitorizando, de heitor segurando sua mão e dizendo palavras encorajadoras que ela mal registrava através da dor.
Lorenzo chegou após as primeiras 6 horas. Heitor havia saído brevemente para tomar um café e quando voltou encontrou Lorenzo na sala de espera. Você veio disse Heitor e havia genuína gratidão em sua voz. Claro que vim. É meu afilhado que está chegando. Lorenzo sorriu, mas Valentina podia ver atenção em torno de seus olhos. Como ela está? Cansada, com dor, mas forte.
Heitor passou a mão pelo cabelo. Muito mais forte do que eu jamais seria. As mulheres sempre são. Os dois homens ficaram no corredor conversando em voz baixa, enquanto Valentina atravessava mais uma contração. Quando finalmente passou, ela chamou: “Eitor, pode trazer Lorenzo aqui?” Heitor hesitou por um breve segundo, mas então assentiu e foi buscar o irmão.
Lorenzo entrou no quarto com passos hesitantes, claramente desconfortável, mas quando seus olhos encontraram os de Valentina, algo amoleceu em sua expressão. “Como você está?”, perguntou ele suavemente, aproximando-se da cama. Aterrorizada, admitiu ela, a voz trêmula: “E se algo der errado? E se depois de tudo isso, de toda a luta, eu ainda perder? Ei, ei. Lorenzo pegou sua mão livre.
Heitor segurava a outra e apertou suavemente. Você é a mulher mais forte que eu conheço. Você sobreviveu a um casamento difícil, a uma hemorragia potencialmente fatal, há três meses de repouso. Você vai sobreviver a isso também e seu bebê vai ser perfeito. Você promete? Lorenzo sorriu, os olhos brilhando com emoção contida.
Eu prometo e você sabe que eu nunca minhas promessas. Valentina queria dizer algo. Queria expressar o quanto aquelas palavras significavam para ela. Mas outra contração chegou mais forte desta vez, e tudo que saiu de sua boca foi um grito de dor. As próximas horas foram um borrão. Médicos entrando e saindo, enfermeiras verificando dilatação. Anestesista aplicando epidural.
Eitor permaneceu ao seu lado direito, Lorenzo ao esquerdo, ambos segurando suas mãos, oferecendo palavras de encorajamento. E então, finalmente, aos gritos de Empurra da Obstetra, Valentina sentiu uma pressão imensa e depois subitamente alívio. E então o som mais bonito que ela já tinha ouvido em toda a sua vida, o choro agudo de um recém-nascido.
É uma menina, anunciou a médica levantando o bebê minúsculo e vermelho. uma menina linda e saudável. Valentina estendeu os braços instintivamente e segundos depois tinham colocado sua filha sobre seu peito. Ela era tão pequena, tão perfeita, com mechas escuras de cabelo molhado e olhos espremidos fechados.
Seus punhos minúsculos se agitavam no ar, protestando contra o mundo frio e brilhante no qual tinha acabado de nascer. Olá, pequena”, sussurrou Valentina, as lágrimas correndo livremente por seu rosto. “Olá, meu amor, eu te esperei por tanto tempo.” Ela levantou os olhos e encontrou Eitor olhando para o bebê com uma expressão de total admiração. Lágrimas escorriam por seu rosto.
Valentina nunca o tinha visto chorar antes e ele tinha uma mão sobre a boca, como se estivesse tentando conter um soluço. “Ela é perfeita”, disse ele, a voz quebrada. Ela é absolutamente perfeita. Você quer pegá-la? Com mãos trêmulas, Heitor recebeu o bebê. Ele assegurou com tanto cuidado como se ela fosse feita de vidro. E Valentina viu o momento exato em que ele se apaixonou.
Seus olhos se suavizaram. Seu rosto inteiro se transformou. E quando ele olhou de volta para Valentina, havia tanto amor ali que ela sentiu seu coração apertar. “Obrigado”, disse ele, a voz pouco mais que um sussurro. Obrigado por me dar isso, por nos dar ela. Do outro lado da cama, Lorenzo observava a cena com uma expressão complexa: alegria misturada com dor, amor mesclado com perda.
Quando percebeu que Valentina o estava observando, ele piscou rapidamente e sorriu. “Sá parabéns”, disse ele suavemente. “Vocês dois vão ser pais incríveis.” Você também, disseitor de repente, estendendo o bebê para Lorenzo. Você é o padrinho dela. Você faz parte disso também. Lorenzo hesitou, seus olhos perguntando silenciosamente a Valentina se estava tudo bem.
Ela assentiu e ele finalmente recebeu o bebê em seus braços. Observar Lorenzo segurando sua filha foi uma das experiências mais agridoces da vida de Valentina. Ele olhava para o bebê com tanta ternura, tanta devoção, que era doloroso. E quando ele ergueu os olhos para Valentina, ela viu ali um futuro alternativo, um mundo onde esse bebê poderia ter sido deles, onde eles poderiam ter sido uma família de verdade. Mas esse não era o mundo em que viviam.
Esse era o mundo onde Lorenzo era apenas o padrinho, onde seu papel era amar de longe, onde ele teria que devolver esse bebê precioso para os braços de seu irmão e fingir que não estava com o coração partido. “Como vamos chamá-la?”, perguntou Heitor, trazendo Valentina de volta ao presente. Valentina havia pensado sobre isso durante meses, havia feito listas de nomes, havia debatido consigo mesma infinitamente. “Mait”, disse ela finalmente. “Seu nome é Maitê”.
“Maitê Cavalcante”, repetiu Heitor testando o nome. Um sorriso se espalhou por seu rosto. “É perfeito. Ela é perfeita”. Lorenzo olhou para a bebê em seus braços, para a pequena Maitê que bocejava e se aconcheggava contra seu peito. “Bem-vinda ao mundo, pequena Maitê”, murmurou ele. “Você não sabe ainda, mas é a pessoa mais sortuda do mundo.
Tem uma mãe que lutou com unhas e dentes para te manter segura e um pai que te ama mais do que qualquer coisa. E naquele momento, olhando para os três homens em sua vida, seu marido, sua filha e o homem que ela nunca poderia ter, Valentina se permitiu acreditar que talvez, apenas, talvez eles pudessem fazer isso funcionar.
Maitê tinha apenas duas semanas quando Valentina percebeu que Heitor tinha mudado de verdade. Ele estava no quarto do bebê às 3 da manhã, andando de um lado para o outro com Maitê no colo, cantando suavemente uma canção de Ninar que Valentina não reconhecia. A bebê tinha cólicas e vinha chorando há horas. E Eitor havia insistido que Valentina dormisse enquanto ele cuidava dela.
Valentina estava na porta observando a cena pela fresta. Heitor usava uma camiseta velha e calças de moletom, tão diferente dos ternos Hugo Boss impecáveis que costumava usar. Tinha olheiras profundas sobre os olhos, o cabelo estava despenteado e havia uma mancha de leite regurgitado em seu ombro e ele nunca tinha parecido mais bonito. “Calma, pequena”, murmurava ele, balançando suavemente. “Papai está aqui.
Papai sempre vai estar aqui.” Valentina sentiu as lágrimas queimar em seus olhos. Era isso. Era o que ela tinha ansiado por todo aquele tempo. Um marido que realmente se importava, que realmente estava presente. E Heitor estava entregando exatamente isso.
Então, por que uma parte dela ainda sentia falta de Lorenzo? Os meses se passaram em um borrão de fraldas sujas, mamadas noturnas e primeiros sorrisos? Reitor manteve sua promessa. Trabalhou menos esteve mais presente. Foi um pai dedicado. Ele acordava com Maitê de madrugada. trocava fraldas sem reclamar. Aprendeu a fazer mamadeiras com a perfeição de um chefe.
Lorenzo visitava uma vez por semana, sempre aos sábados à tarde. Ele trazia presentes para Maitê, livros infantis, roupinhas, brinquedos educativos. sentava no chão da sala de estar com ela, fazendo caretas engraçadas que a faziam gargalhar, contando histórias sobre os projetos na zona leste. E toda vez que ia embora, Valentina sentia como se parte de sua alma fosse arrancada. Maitê fez um ano em uma tarde ensolarada de outubro.
Eles organizaram uma festa no Jardim da Mansão, família, amigos, colegas de trabalho de heitor. Havia um bolo de três andares decorado com flores de açúcar, balões cor- de-osa por toda parte. e uma pequena piscina inflável, onde as crianças podiam brincar.
Valentina usava um vestido amarelo claro, o cabelo preso em um coque frouxo. Ela havia perdido quase todo o peso da gravidez e se sentia pela primeira vez em mais de um ano como ela mesma novamente. “Você está radiante”, disse uma voz atrás dela. Valentina se virou e encontrou Lorenzo parado ali, segurando um presente embrulhado em papel brilhante. Ele usava uma camisa social azul clara e calças CAC, e o sol da tarde iluminava as manchas douradas em seus olhos castanhos. Obrigada.
Ela aceitou o presente, seus dedos roçando brevemente os dele. Você não precisava trazer nada. Já trouxe tanto para minha afilhada? Sempre. Lorenzo sorriu, mas não alcançou seus olhos. Onde está a aniversariante? É um mostrando para todo mundo como ela aprendeu a bater palmas. Eles caminharam juntos pelo jardim, mantendo uma distância cuidadosa.
Valentina estava hipercente de cada movimento de Lorenzo, de como ele ajustava o passo para combinar com o dela, de como ele automaticamente colocava a mão em suas costas ao guiá-la em torno de um grupo de convidados. “Como você está?”, perguntou ele suavemente. “De verdade? Cansada”, admitiu ela. “Faité ainda acorda três vezes por noite, mas feliz. Eitor é um pai maravilhoso.
Ele realmente mudou, Lorenzo. Eu vejo. Havia algo na voz dele que fez Valentina olhar de perto para seu rosto. E você e ele, vocês estão bem como casal. Valentina hesitou. A verdade era complicada. Heitor era atencioso, carinhoso, um parceiro excelente na criação de Maitê.
Mas romanticamente, sexualmente, eles raramente se tocavam além de beijos castos de boa noite. Dormiam na mesma cama, mas poderia haver um oceano entre eles pela falta de intimidade. “Estamos bem”, disse ela finalmente, “porque era mais fácil do que explicar a verdade complicada. Estamos construindo algo lentamente.” Lorenzo a sentiu, mas havia decepção em seus olhos. Ou seria a esperança? Valentina não tinha certeza. Tio Lorenzo.
A voz aguda de Maitê cortou o momento. A pequena estava nos braços de Heitor, os bracinhos estendidos em direção a Lorenzo. Colô, colô. Lorenzo riu, pegando a menina que se jogou em seus braços. Maite imediatamente agarrou seu nariz, rindo quando ele fingiu que doia. “Cuidado, pequena”, brincou ele. “Preciso desse nariz. Ela te adora.
” Observou Heitor, aparecendo ao lado de Valentina. Ele passou o braço em volta da cintura dela em um gesto possessivo que não passou despercebido por Lorenzo. Você tem jeito com crianças. Deveria ter alguns próprios. Um músculo se contraiu no maxilar de Lorenzo. Talvez um dia, mas você teria que encontrar uma esposa primeiro. Continuou o Heitor. Alheio a atenção que havia se instalado.
Você namorou alguém recentemente? Aquela professora que a fundação contratou, como era o nome dela mesmo? Camila respondeu Lorenzo ainda brincando com Maitê, mas claramente desconfortável. E não, não estamos namorando, apenas trabalhando juntos. Você deveria. Heitor apertou Valentina contra si. Ter uma família, um filho, muda tudo. Faz você perceber o que realmente importa.
Valentina viu a dor passar pelo rosto de Lorenzo, rápida, mas inconfundível. Ela quis dizer algo, fazer algo para aliviar aquela dor. Mas o que poderia dizer? Desculpe meu marido não perceber que está esfregando nossa felicidade na sua cara. Talvez um dia! Repetiu Lorenzo, devolvendo Maitê para os braços de Heitor.
Mas por enquanto vou me contentar em ser o melhor padrinho possível. Ele se afastou, então, desculpando-se para ir buscar algo para beber. Valentina observou o ir, o coração apertado. Ele está estranho comentou Heitor, balançando Maitê distraídamente. Você notou? Talvez esteja apenas cansado. O trabalho na fundação é intenso. Ou talvez esteja solitário.
Heitor beijou o topo da cabeça de Maitê. Vou ter que apresentá-lo a algumas amigas suas. Alguém elegante, inteligente. Ele merece ser feliz. Valentina sentiu algo amargo subir em sua garganta. A ideia de Lorenzo com outra mulher, beijando outra mulher, amando outra mulher, era como uma faca no estômago. “Talvez devêsemos deixá-lo encontrar sua própria felicidade”, disse ela, mais brusca do que pretendia.
Heitor olhou com surpresa. “Tudo bem, você está pálida, só cansada. Vou pegar um pouco de ar”. Ela se afastou antes que ele pudesse protestar, caminhando rapidamente pelo jardim até chegar à parte isolada perto do IP amarelo. Ali, longe dos olhares curiosos, ela permitiu que as lágrimas caíssem. Ela amava Heitor, ou pelo menos ela queria amá-lo.
Ele era um bom homem, um bom pai. Ele havia mudado por ela, havia se tornado a pessoa que ela precisava que ele fosse. Mas não importava o quanto tentasse, não importava quantos momentos doces eles compartilhassem, uma parte de seu coração ainda pertencia a Lorenzo. E carregar esse segredo, viver com essa verdade não dita, estava lentamente a despedaçando. Valentina.
Ela se virou e lá estava ele, Lorenzo, parado à entrada do espaço isolado, os olhos preocupados. Você está chorando. Não é nada. Ela limpou rapidamente as lágrimas. Apenas emocional. É o primeiro aniversário da Mait. E não minta para mim. Lorenzo deu um passo em sua direção, depois parou como se estivesse lutando contra si mesmo.
Por favor, Valentina, de todas as pessoas no mundo, não minta para mim. O que você quer que eu diga? As palavras saíram em um jorro desesperado. Que eu penso em você todos os dias. que toda vez que você vai embora, eu sinto como se tivesse perdido algo precioso. Que mesmo quando estou com o Heitor, mesmo quando ele está sendo o marido perfeito, uma parte de mim ainda anseia por você.
Lorenzo fechou os olhos, o maxilar tenso. Você não pode dizer essas coisas. Eu sei. Valentina deu um passo em sua direção, as palavras continuando a jorrar agora que tinha começado. Eu sei que não deveria sentir isso. Sei que é errado, que é desleal, que Heitor não merece isso. Mas eu não sei como parar, Lorenzo.
Eu não sei como fazer meu coração entender o que minha cabeça sabe. Valentina, a voz dele estava quebrada, carregada de dor. Você está matando a gente. Essas palavras, esses sentimentos, eles estão nos matando. Então, me diga como parar. Ela estava chorando abertamente agora, sem se importar. Me diga como deixar de te amar, porque eu tentei. Deus sabe que eu tentei.
Lorenzo abriu os olhos e o que ela viu ali a deixou sem ar. Amor, desejo, dor, tudo misturado em uma tempestade de emoções. Eu não sei como parar, admitiu ele, a voz apenas um sussurro. Porque eu também tentei e falhei miseravelmente. Eles ficaram ali a meio metro de distância, o mundo inteiro se reduzindo apenas aos dois.
Valentina podia ouvir risos distantes da festa, o som de Maitê gritando alegremente, mas tudo parecia estar a quilômetros de distância. “O que vamos fazer?”, perguntou ela, a voz fraca. “Nada.” Lorenzo recuou, criando mais distância entre eles. “Vamos continuar como estamos. Você vai continuar sendo a esposa do Heitor e eu vou continuar sendo o padrinho de Maitê.
E vamos guardar esses sentimentos, enterrá-los tão fundo, que talvez um dia eles parem de nos assombrar. E se eles nunca pararem? Lorenzo sorriu, mas era um sorriso triste, sem alegria. Então vamos aprender a viver com a dor, porque a alternativa destruir uma família, machucar pessoas inocentes é impensável. Ele se virou para ir, mas Valentina chamou seu nome.
Quando ele olhou para trás, ela disse: “Você é um homem bom, Lorenzo Cavalcante, o melhor homem que eu conheço. Se eu fosse bom”, respondeu ele suavemente, “eu não estaria apaixonado pela esposa do meu irmão.” E com essas palavras, ele a deixou sozinha sob o IP amarelo, com o coração partido, e um futuro que parecia simultaneamente definido e incerto.
Seis meses se passaram desde a festa de aniversário de Maitê. 6 meses de Lorenzo mantendo distância, visitando apenas quando absolutamente necessário, sempre com Heitor presente. Seis meses de Valentina fingindo que não sentia um vazio toda vez que ele ia embora. E seis meses de Heitor sendo o marido perfeito, atencioso, carinhoso, presente.
Era primavera em São Paulo e a cidade estava em sua glória máxima. O IP amarelo no jardim havia florescido novamente, suas pétalas douradas cobrindo o gramado como confete. Maê tinha um ano e meio agora, correndo pelo jardim em suas perninhas rechonchudas, rindo e tentando pegar as flores que caíam. Valentina estava sentada na varanda, observando a filha brincar quando o Heitor apareceu com um envelope grosso nas mãos.
“Chegou isto para você”, disse ele, entregando o envelope. Da USP. O coração de Valentina pulou. Ela tinha se inscrito secretamente para retomar seu curso de letras, mas não tinha contado a Eitor ainda. Não tinha certeza de como ele reagiria. Com dedos trêmulos, ela abriu o envelope e leu a carta dentro dele.
“Eu fui aceita”, sussurrou ela, os olhos se arregalando. “Eles vão aceitar todos os créditos que eu tinha. Posso terminar meu curso? Posso Posso finalmente terminar algo que comecei?” Ela levantou os olhos para Eitor, esperando. O quê? Raiva? Decepção? Mas o que viu foi orgulho puro. Isso é maravilhoso disse ele sorrindo amplamente.
Por que não me contou que se inscreveu? Eu eu não tinha certeza de como você reagiria. Da última vez você disse: “Eu sei o que eu disse”. Heitor se sentou ao lado dela pegando sua mão. E eu estava errado, completamente errado. Você deveria absolutamente terminar seu curso. Deveria perseguir seus sonhos. Eu vou te apoiar em tudo. Valentina sentiu as lágrimas queimar em seus olhos. Era isso. Era o que ela tinha pedido, rezado, suplicado por tanto tempo.
Um marido que a apoiava, que queria vê-la crescer. E Maitê? perguntou ela. As aulas são durante o dia e dona Célia pode ajudar que eu vou ajustar meu horário para estar em casa mais. Heitor beijou seus dedos. Nós vamos fazer funcionar, Valentina, juntos. E por um momento, Valentina se permitiu acreditar que ela tinha feito a escolha certa, que ficar com Heitor, trabalhar no casamento, tinha valido a pena. Mas então veio o evento beneficente.
Era a gala anual da Fundação Cavalcante, um evento glamoroso no Hotel Unique, que reunia a elite de São Paulo para arrecadar fundos para projetos sociais. Heitor, como um dos principais doadores, sempre comparecia. E este ano, pela primeira vez desde que Maitê nasceu, Valentina o acompanharia. Ela usava um vestido de gala azul marinho, o decote modesto, mas elegante, o tecido fluindo ao redor de seu corpo como água.
Dona Célia havia ajudado com seus cabelos, prendendo-os em um coque sofisticado com alguns fios soltos e moldurando seu rosto. Ela se sentia bonita, não apenas apresentável, mas verdadeiramente bonita, pela primeira vez em muito tempo. “Você está deslumbrante”, disse Heitor quando ela desceu as escadas.
Ele estava impecável em um smoking preto, a gravata borboleta perfeitamente amarrada. Vou ter que vigiar você a noite toda para afastar os pretendentes. Valentina riu, permitindo que ele a ajudasse a colocar o casaco. Eu acho que é seguro dizer que não há perigo disso. Você se subestima.
O hotel Unique era tão impressionante quanto Valentina lembrava das poucas vezes que tinha estado lá. O salão de festas estava decorado com milhares de luzes cintilantes, mesas cobertas com toalhas brancas impecáveis, arranjos florais extravagantes em cada canto. E no centro de tudo, coordenando o evento com eficiência tranquila, estava Lorenzo. Valentina o viu antes dele vê-la. Ele usava um smoking que se ajustava perfeitamente ao seu corpo alto, o cabelo penteado para trás, revelando sua testa alta. Ele estava conversando com um grupo de doadores, sorrindo e gesticulando completamente à vontade. E
então seus olhos encontraram os dela através do salão lotado e o mundo parou. A reação foi instantânea e devastadora. Valentina sentiu como se todo o ar tivesse sido sugado de seus pulmões. O coração bateu tão forte que ela tinha certeza de que todos podiam ouvi-lo.
E pelo modo como os olhos de Lorenzo se arregalaram, como seu sorriso hesitou, ela soube que ele estava sentindo a mesma coisa. “Vamos cumprimentar Lorenzo?”, sugeriu Heitor, inconsciente do momento carregado. “Ele trabalhou tanto neste evento, devemos congratulá-lo.” Valentina assentiu, não confiando na própria voz. Eles atravessaram o salão e cada passo parecia levar uma eternidade.
Lorenzo os observou se aproximar, uma máscara educada de cordialidade, substituindo a emoção crua que Valentina tinha visto momentos antes. “Eitor! Valentina!”, Ele estendeu a mão para Eitor, apertando-a firmemente. Depois se virou para Valentina e houve a menor hesitação antes de pegar sua mão e beijá-la levemente, como era costume. Você está Você está linda. Obrigada.
A voz dela saiu rouca. O evento está maravilhoso. Você fez um trabalho incrível. trabalho de equipe. Lorenzo soltou a mão dela rapidamente, como se o toque queimasse. Não posso levar todo o crédito. Um garçom passou com uma bandeja de champanhe. Eitor pegou duas taças, oferecendo uma para Valentina. “Um brinde”, disse ele, erguendo a taça.
“Ao meu irmão brilhante, que está mudando vidas todos os dias”. Eles brindaram, o tinido do cristal suando alto no salão. Valentina bebeu, agradecida por ter algo para fazer com as mãos. Como está Maitê?”, perguntou Lorenzo. E havia saudade genuína em sua voz.
“Sinto falta das visitas semanais, crescendo como uma erva daninha”, respondeu e orgulhosamente. “Já está falando em frases curtas. Ontem ela disse: “Papai bobo e nós dois rimos por 5 minutos seguidos.” Ela pergunta por você”, acrescentou Valentina e então se arrependeu quando viu a dor passar pelo rosto de Lorenzo. Pergunta quando o tio Lou vai visitá-la.
“Em breve”, prometeu Lorenzo, mas ambos sabiam que era uma promessa vazia. “Tem sido complicado com o trabalho. Você trabalha demais”, disse Heitor, dando um tapinha no ombro do irmão. “Deveria arranjar tempo para viver um pouco, talvez encontrar uma namorada”. Lorenzo sorriu, mas não alcançou seus olhos. Talvez. Na verdade, Heitor se virou para Valentina. Tem aquela sua amiga da USP, a Fernanda.
Ela não é professora também? Talvez pudéssemos organizar um jantar. Heitor, não. Cortou Lorenzo, mais brusco do que pretendia, depois mais suavemente. Eu aprecio a preocupação, mas não preciso de ajuda para encontrar companhia. Um silêncio constrangido caiu sobre eles. Valentina tomou outro gole de champanhe, desejando estar em qualquer lugar além dali.
“Eu preciso preciso ir ao banheiro”, murmurou ela, colocando a taça vazia em uma mesa próxima. “Vocês se importam?” “Claro que não.” Heitor beijou sua bochecha. “Não demore muito.” A apresentação começa em 15 minutos. Valentina se afastou rapidamente, atravessando o salão em direção ao corredor que levava aos banheiros. Mas uma vez lá ela não entrou.
Em vez disso, continuou andando até encontrar uma varanda vazia que dava para a piscina iluminada do hotel. O ar noturno era fresco contra sua pele aquecida. Ela se apoiou no parapeito, fechando os olhos e respirando profundamente. Não podia fazer isso.
Não podia continuar fingindo que ver Lorenzo não a afetava, que ela estava perfeitamente feliz em seu casamento com Heitor. Você também sentiu. Valentina se virou de um salto. Lorenzo estava parado na porta da varanda, a gravata borboleta já desfeita. Os primeiros dois botões da camisa abertos. Ele parecia desgrenhado, desesperado, tão diferente do homem controlado de momentos atrás. “Lorenzo, você não deveria estar aqui. Heitor vai perceber. Eu não me importo.
” Ele atravessou a varanda em três passos longos. Eu não aguento mais isso, Valentina. Não aguento mais fingir que não sinto o que sinto. Que ver você com ele não me mata um pouco mais a cada dia. Nós conversamos sobre isso. Nós decidimos. Nós não decidimos nada. Sua voz subiu desesperada. Você decidiu. Você escolheu ficar com ele e eu respeitei essa escolha.
Mas isso não faz com que doa menos, não faz com que eu pare de te amar. As palavras pairaram no ar entre eles, cruas e honestas e devastadoras. Lorenzo. Valentina sentiu as lágrimas queimar em seus olhos. Por favor, não faça isso. Então me diga. Ele deu mais um passo, fechando a distância entre eles. Olhe nos meus olhos e me diga que você não sente o mesmo.
Que quando me viu hoje à noite, seu coração não pulou. Que você não pensa em mim, não sonha comigo, não imagina como seria se as coisas fossem diferentes. Não é justo. Eu sei. Ele ergueu a mão, os dedos pairando a centímetros de seu rosto, mas sem tocá-la. Nada disso é justo.
Não é justo que eu me apaixonei pela mulher errada. Não é justo que você está presa em um casamento que começou sem amor. Não é justo que Eitor, apesar de todos os seus esforços, nunca vai te conhecer da forma que eu conheço. Eitor é um bom homem, disse Valentina, mas sua voz estava fraca. Ele mudou. Ele me ama.
Mas você o ama? E ali estava a pergunta que Valentina tinha evitado por um ano e meio, a pergunta cuja resposta ela conhecia, mas tinha medo de admitir. “Eu estou tentando”, sussurrou ela. “Todos os dias eu estou tentando amá-lo da forma que ele merece, mas você não consegue.” Lorenzo finalmente a tocou, suas mãos enquadrando seu rosto com tanta ternura que ela sentiu um soluço subir em sua garganta.
Porque você já ama outra pessoa, Lorenzo, pare. Mas ele não parou. Em vez disso, ele se inclinou e a beijou. O beijo foi tudo que Valentina tinha imaginado e mais. Suave, mas desesperado, terno, mas apaixonado. Ela deveria ter se afastado, deveria ter protestado, mas em vez disso, suas mãos subiram para agarrar a lapela dele, puxando-o para mais perto.
Por um momento glorioso e terrível, ela se permitiu sentir todo o amor, todo o desejo, toda a conexão que tinha negado por tanto tempo. Torenzo a beijou como se ela fosse ar e ele estivesse se afogando, como se ela fosse luz e ele tivesse estado na escuridão. E então a realidade voltou com força esmagadora.
Valentina se afastou bruscamente, levando as mãos aos lábios, os olhos arregalados de horror. Não, não, não, não. Ela recuou, colocando distância entre eles. Nós não podemos. Eu não posso, Valentina. Eu sou casada. As palavras saíram em um grito sufocado. Eu tenho uma filha. Eu fiz uma promessa, Lorenzo, para Eitor, para Maitê, para mim mesma. Eu não posso fazer isso com eles.
Mas você pode fazer isso com você mesma. Lorenzo estava com a respiração pesada, os olhos brilhando com emoção não derramada. Você pode continuar vivendo uma mentira, fingindo estar feliz quando claramente não está. Eu estou feliz. Eitor me faz feliz. Então, por que você me beijou de volta? Valentina não tinha resposta para isso. Ou melhor, tinha, mas era uma resposta que não podia dar voz.
“Eu preciso ir”, disse ela, passando por ele em direção à porta. Preciso voltar para meu marido. Valentina, espera. Mas ela já tinha ido, deixando Lorenzo sozinho na varanda, com o gosto dela ainda em seus lábios e o coração despedaçado em seu peito. E enquanto ela voltava para o salão, compondo um sorriso e entrelaçando o braço com oitor, uma única verdade ressoava em sua mente. Ela não poderia mais fingir.
Algo tinha quebrado naquela varanda e ela não sabia se algum dia conseguiria reparar. Valentina não dormiu naquela noite. Ficou deitada ao lado de Eitor, que roncava suavemente, revivendo aquele beijo repetidas vezes. O toque dos lábios de Lorenzo nos dela, a maneira como seu corpo tinha se encaixado perfeitamente contra o dele, a sensação de que finalmente, pela primeira vez em sua vida, ela estava exatamente ondeia estar.
E então a culpa vinha como uma onda, ameaçando afogá-la. Nos dias seguintes, Valentina evitou Lorenzo completamente. Não respondia suas ligações, não abria suas mensagens. Quando ele apareceu na mansão, ela inventou desculpas. Estava com dor de cabeça. Maitê precisava dela. Tinha compromissos anteriores. Heitor notou sua agitação. “Você está bem?”, perguntou ele uma noite enquanto jantavam.
Maitê estava em sua cadeirinha brincando com pedaços de macarrão. Você parece distante. Estou bem, só cansada. Valentina empurrou a comida pelo prato sem apetite. As aulas na USP estão mais intensas do que eu lembrava. Você quer parar? Eu não quero que você se sobrecarregue. Não. A resposta saiu mais veemente do que ela pretendia.
Não, eu eu preciso disso. Preciso ter algo que seja meu. Heitor franziu o testa, mas não pressionou. Em vez disso, ele mudou de assunto, falando sobre trabalho, sobre maitê, sobre planos para o fim de semana. E Valentina assentiu nos lugares certos, sorriu quando apropriado e fingiu que seu mundo não estava desmoronando. Foi dona Célia quem finalmente a confrontou.
Era uma tarde de quinta-feira. Valentina estava na biblioteca fingindo ler Grande Sertão Veredas, mas na verdade apenas olhando para as páginas sem ver as palavras. Dona Célia entrou com uma bandeja de café, colocando-a na mesinha ao lado da poltrona de Valentina. “Você precisa comer, senhora”, disse ela suavemente. “Está muito magra. Não estou com fome.
” E não está com fome há uma semana. Dona Célia se sentou na poltrona oposta. Algo que ela nunca fazia. Era um sinal de quão preocupada ela estava. “O que aconteceu na gala?” Valentina ergueu os olhos bruscamente. “Como? Eu trabalho nesta casa há 15 anos. Cuidei de Heitor e Lorenzo quando eram meninos.
Acha que não percebo quando algo está errado? Dona Célia se inclinou para a frente, os olhos bondosos, mas firmes. Você voltou daquele evento diferente, assustada. E Senr. Lorenzo não apareceu aqui desde então. Não aconteceu nada. Não minta para mim, criança. Eu não sou eitor. Eu vejo. As defesas de Valentina finalmente cederam. As lágrimas que ela tinha segurado por dias finalmente caíram.
E ela contou tudo, o beijo, os sentimentos, a culpa esmagadora. Dona Célia ouviu em silêncio, sem julgamento em seu rosto. Quando Valentina terminou, a mulher mais velha suspirou profundamente. “Você ama Lorenzo?” Não era uma pergunta, era uma afirmação simples e devastadora.
Eu eu não sei, mas até enquanto dizia isso, Valentina sabia que era mentira. Tudo bem, sim. Eu amo Lorenzo, mas isso não muda nada. Eu ainda sou casada com Heitor. Ainda sou mãe de Maitê. E você acha que Maitê vai ser feliz crescendo em uma casa onde a mãe está infeliz? Eu não sou infeliz. Heitor é maravilhoso. Ele mudou. Ele Mas você não o ama. Dona Célia pegou a mão de Valentina, apertando-a com firmeza.
Não da forma que deveria, não da forma que você ama, Lorenzo. O que você está sugerindo? Que eu deixe Eitor, que eu destrua a nossa família? Estou sugerindo que você seja honesta com Heitor, mas principalmente consigo mesma.
Dona Célia se levantou, alisando a saia, porque segredos têm uma maneira de vir à tona eventualmente, e quanto mais tempo você espera, mais pessoas se machucam. As palavras de dona Célia ecoaram na mente de Valentina pelos próximos dias. Ela sabia que a mulher mais velha estava certa. Ela precisava ser honesta com Heitor. Mas como? Como você diz ao homem que se transformou por você? que é um pai maravilhoso para sua filha, que você ama o irmão dele.
A decisão foi tirada de suas mãos em uma manhã de terça-feira. Valentina estava na cozinha preparando uma madeira para Maitê, quando ouviu vozes altas vindas do escritório de Heitor. Uma das vozes era de Heitor, a outra era de Lorenzo. “Você não pode continuar fugindo de mim”. A voz de Lorenzo estava carregada de frustração. “Eu ligo, você não atende.
Eu venho aqui. Você inventa desculpas. Que diabos está acontecendo? O que está acontecendo? Heitor respondeu a voz perigosamente calma. É que você aparentemente decidiu que pode aparecer na minha casa sempre que quiser e fazer exigências. Não é sobre isso. É sobre Valentina. Ela está me evitando e eu preciso saber porquê. Valentina largou a mamadeira e correu para o escritório.
Quando chegou à porta, viu Heitor de pé atrás de sua mesa, Lorenzo na frente dela, ambos tensos como cordas de violino. “O que está acontecendo aqui?”, perguntou ela, a voz trêmula. Ambos os homens se viraram para olhá-la. Eitor franziu a testa preocupado. Lorenzo pareceu aliviado e desesperado ao mesmo tempo. “Valentina, finalmente.
” Lorenzo deu um passo em sua direção. “Porque você está me evitando? Eu eu não não minta. Sua voz estava áspera. Eu mereço pelo menos honestidade, não acha? Lorenzo cuidado com o tom, advertiu e contornando a mesa. Você está falando com minha esposa. Eu sei muito bem quem ela é. Lorenzo se virou para o irmão.
Eu sei porque eu Porque ela Porque você o quê? Heitor estava alerta agora, os olhos se estreitando. Complete a frase, Lorenzo. O silêncio que se seguiu foi absoluto e aterrorizante. Valentina podia ouvir seu próprio coração batendo. Podia ver o peito de Lorenzo subindo e descendo com respirações pesadas.
podia sentir atenção irradiando de Heitor. “Nós nos beijamos”, disse Valentina subitamente, a voz saindo em um sussurro, mas soando como um grito no silêncio. “Na gala, na varanda. Nós nos beijamos!” Heitor ficou completamente imóvel. Toda a cor drenou de seu rosto. Por um longo momento, ele apenas ficou ali parado, processando as palavras que tinha acabado de ouvir.
“Você, vocês”, ele não conseguia formar frases completas. Como? Quanto tempo? Foi só aquela vez, disse Lorenzo rapidamente. Eu juro, Heitor, foi só aquela vez. Eu eu perdi o controle. Eu não devia. Você beijou minha esposa. A voz de Heitor estava estranhamente calma, o que, de alguma forma era mais assustador do que se ele estivesse gritando.
Meu irmão beijou minha esposa. Eitor, eu sinto muito começou Valentina, as lágrimas já correndo. Eu nunca quis. Quanto tempo”, interrompeu Heitor, finalmente olhando para ela. E o que ela viu em seus olhos a fez recuar. Traição, dor, fúria, tudo misturado. Quanto tempo vocês dois? Nós não fizemos nada. Lorenzo estava desesperado. Agora nós nunca.
Foi só aquele beijo. Eu te juro. Mas vocês queriam. Eitor riu. Mas era um som amargo, sem humor. Vocês queriam e provavelmente ainda querem. Heitor. Valentina tentou se aproximar, mas ele levantou a mão, parando-a. Não, não chegue perto de mim. Ele pegou as chaves do carro sobre a mesa. Eu preciso, preciso sair daqui.
Eitor, por favor, vamos conversar sobre isso? Implorou Valentina. Não vá assim não quando você está assim. Mas Eitor já estava saindo, passando por ela sem olhar, seus passos ecoando pelo corredor de mármore. Eles ouviram a porta da frente bater, o ronco do motor do carro, o som dos pneus cantando na saída e, então, silêncio.
Valentina se deixou escorregar pela parede até sentar no chão, abraçando os joelhos contra o peito. Lorenzo ficou parado por um momento, depois se aproximou lentamente, ajoelhando-se ao lado dela. Valentina, eu sinto muito. Isso é culpa minha. Eu não devia ter vindo aqui. Não devia ter pressionado. Não é culpa sua, é minha.
Ela levantou o rosto, os olhos vermelhos e inchados. Eu deveria ter contado a ele antes. Deveria ter sido honesta desde o início. O que vamos fazer agora? Valentina não tinha resposta. Tudo o que sabia era que tinha acabado de destruir seu casamento. Tinha partido o coração de um homem bom e tinha colocado um abismo entre dois irmãos.
E pela primeira vez desde que tudo começou, ela não tinha certeza se o amor que sentia por Lorenzo valia todo o dano que tinha causado. Heitor não voltou naquela noite, nem na noite seguinte. Valentina ligou inúmeras vezes, mas suas chamadas iam direto para a caixa postal. Ela mandou mensagens, e-mails, tudo sem resposta.
Lorenzo ficou na mansão, não querendo deixar Valentina sozinha, mas mantendo distância respeitosa. Ele dormiu no quarto de hóspedes, ajudou com Maitê, mas não tentou ter nenhuma conversa profunda sobre o que aconteceu. Foi dona Célia quem finalmente trouxe notícias. “Senhor Heitor está hospedado no hotel da Faria Lima”, disse ela entrando na sala onde Valentina estava sentada com Maitê no colo. Ele ligou pedindo que eu embalasse algumas roupas.
Ele falou alguma coisa? sobre voltar, sobre dona Célia balançou a cabeça tristemente. Só disse que precisava de tempo para processar e pediu para eu cuidar de você e da pequena Maitê. Valentina sentiu as lágrimas queimarem novamente. Mesmo devastado, mesmo traído, Heitor ainda se preocupava com elas. Isso de alguma forma tornava tudo pior.
Foram três dias de tortura antes de Heitor finalmente retornar. Ele apareceu em uma tarde de sábado, parecendo exausto. Olheiras profundas, roupas amassadas, o cabelo sem vida. “Precisamos conversar”, disse ele. A voz rouca de tanto não usar. Eles se sentaram na sala de estar. Maitê brincando alegremente no tapete entre eles, alheia a atenção. Lorenzo estava no jardim, dando-lhes privacidade.
Eu passei os últimos dias pensando começou Heitor, não olhando para ela, tentando entender como chegamos aqui, onde eu errei, o que eu poderia ter feito diferente. Você não errou nada, disse Valentina rapidamente. Eitor, você foi maravilhoso. Você mudou. Você se tornou o homem que eu precisava, mas não o homem que você queria. As palavras pairaram no ar, cruas e honestas.
“Eu te amo”, disse Valentina. E era verdade, de uma forma. Você é um homem bom, um pai maravilhoso. Eu sou grata por tudo que você fez, mas você ama Lorenzo mais. Não era uma pergunta, era uma constatação. E Valentina não podia negar. Eu sinto muito sussurrou ela. Eu nunca quis que isso acontecesse. Nunca quis te machucar. Mas aconteceu.
Heitor finalmente a olhou. E havia tal cansaço em seus olhos que o coração de Valentina se apertou. E agora temos que decidir o que fazer. O que você quer fazer? Heitor se levantou caminhando até a janela. Ficou ali parado por um longo momento, observando Maitê brincar, os ombros tensos.
Eu quero que você seja feliz”, disse ele finalmente. “Eu queria ser capaz de te fazer feliz, mas claramente não sou e talvez nunca tenha sido Heitor. Eu vou assinar os papéis do divórcio.” Ele se virou e havia lágrimas em seus olhos. Não vou lutar contra isso. Não vou tornar isso difícil.
Você merece estar com alguém que você ama de verdade. E Maitê merece pais que são genuinamente felizes, mesmo que sepados. Valentina não esperava isso. Esperava raiva, acusações, talvez até um ultimato, mas não essa rendição graciosa. E quanto a custódia? Perguntou ela com voz trêmula, compartilhada. Heitor limpou as lágrimas com as costas da mão. Eu sou o pai dela, Valentina.
Nada do que aconteceu entre nós muda isso. Eu quero estar presente na vida dela. Quero ser um pai, mesmo que não seja mais seu marido. Claro, é claro que sim. E Lorenzo? A pergunta saiu tensa. Você vai? Vocês vão? Eu não sei. E era verdade. Valentina não tinha pensado além de consertar o dano que tinha causado.
Eu preciso de tempo para processar, para entender o que eu realmente quero. Heitor sentiu parecendo aliviado. Bom, porque não importa o que aconteça entre você e ele, ele ainda é meu irmão e eu não quero perdê-lo também. Heitor, você é você é um homem melhor do que eu merecia. Não, Valentina. Ele se aproximou, pegando a mão dela por um breve momento. Você merece alguém que te ame com todo o coração. Eu tentei.
Deus sabe que tentei, mas o coração é teimoso e o seu nunca foi completamente meu. Ele beijou a testa dela. Um beijo de despedida, depois se abaixou para pegar Maitê. A menina riu, agarrando o nariz do pai. “Papá!”, gritou ela alegremente. “Olá, minha pequena”.
Eitora a abraçou com força, enterrando o rosto nos cabelos dela. Papai sempre vai te amar. Sempre, sempre, sempre. Entendeu? Papá ama. Concordou Maitê, sem entender a gravidade do momento. Eitor a devolveu para Valentina, depois recuou. Eu vou ficar no hotel por enquanto. Meus advogados vão entrar em contato para discutir os detalhes do divórcio, mas vou voltar no fim de semana para ficar com Mait, se tudo bem.
Claro, sempre que você quiser. Heitor assentiu, depois caminhou em direção à porta. Ali ele parou, olhando para trás uma última vez. Seja feliz, Valentina, disse ele suavemente. É tudo que eu sempre quis para você. E então ele se foi, deixando Valentina sozinha com sua filha e o peso esmagador de tudo que tinha acontecido.
Os meses seguintes foram um turbilhão de mudanças. O divórcio foi finalizado com surpreendente rapidez. Eitor manteve sua palavra e não complicou nada. Valentina manteve a mansão, mas só porque Heitor insistiu, dizendo que Maitê precisava de estabilidade. Ele comprou um apartamento próximo e pegava Maitê todos os fins de semana.
E, surpreendentemente eles desenvolveram uma amizade genuína. Era estranho no início conversar com seu ex-marido sem a bagagem de um casamento falido, mas aos poucos eles encontraram um ritmo. Discutiam planos para Maitê, compartilhavam histórias engraçadas, até saíam juntos ocasionalmente para eventos da escola. Lorenzo manteve distância durante todo esse tempo.
Ele e Heitor tinham tido uma conversa, uma que nenhum deles quis compartilhar com Valentina, mas depois disso eles estavam se falando novamente. Não era o que tinha sido antes, mas era um começo. Valentina se concentrou em si mesma. Terminou seu curso na USP, formando-se com honras.
Começou a trabalhar como revisora freelance, algo que podia fazer de casa enquanto cuidava de Maitê. fez terapia, aprendeu a gostar de si mesma novamente e Lorenzo, Lorenzo esperou. Foi seis meses após o divórcio ser finalizado que eles finalmente tiveram sua primeira conversa real. Lorenzo havia ligado, perguntando se poderia visitá-los, não como padrinho de Maitê, mas como Ele não terminou a frase. Valentina disse sim.
Ele chegou em uma tarde de domingo carregando flores do campo, não rosas caras, mas Margaridas. simples e amarelas, as favoritas de Valentina, que ele havia descoberto através de observação cuidadosa ao longo dos anos. “Estas são para você”, disse ele, estendendo o buquê. “Se você quiser, senão eu entendo.
” Valentina pegou as flores, pressionando o rosto contra as pétalas macias. “Obrigada, são lindas.” Eles se sentaram na varanda dos fundos, onde tudo tinha começado tantos anos atrás. O IP amarelo estava em plena floração novamente, suas pétalas douradas dançando no vento. “Como você está?”, perguntou Lorenzo suavemente. “Melhor.
E era verdade, mais leve, como se eu finalmente pudesse respirar adequadamente pela primeira vez em anos.” E Maitê, ajustando-se bem, ela ama os fins de semana com Heitor. E ele é, ele é um pai incrível. Ele sempre foi capaz de amar completamente. Lorenzo sorriu tristemente. Só não sabia como eles ficaram em silêncio por um momento, ouvindo os pássaros, sentindo a brisa.
Valentina, eu Lorenzo pausou claramente lutando para encontrar as palavras certas. Eu não vim aqui para pressionar você. Não vim pedir nada. Só queria que você soubesse que eu estou aqui. Se você precisar de mim em qualquer capacidade, amigo, confidente, qualquer coisa, eu estou aqui. E se eu precisar de mais? As palavras saíram antes que Valentina pudesse detê-las.
E se eu precisar de você como mais que um amigo? Lorenzo a encarou, o coração claramente em seus olhos. Então eu estaria aqui para isso também. Mas só quando você estiver pronta, sem pressa, sem pressão. Eu acho. Valentina respirou fundo, reunindo coragem. Eu acho que estou pronta. Não para algo sério imediatamente, não para morar juntos ou grandes declarações, mas para tentar, para ver se o que sentimos um pelo outro é real ou apenas fruto de circunstâncias impossíveis. É real, disse Lorenzo firmemente. Pelo menos para mim é real. sempre foi.
Então vamos descobrir. Valentina estendeu a mão e Lorenzo a pegou, entrelaçando seus dedos juntos. Lorenzo sorriu e era o primeiro sorriso genuinamente feliz que ela havia em seu rosto em anos. Juntos”, repetiu ele. E enquanto o sol se punha sobre São Paulo, pintando o céu de laranjas e rosas, eles permaneceram sentados de mãos dadas, o começo de algo novo e assustador e maravilhoso se desenrolando entre eles.
Mas eles não sabiam ainda que o maior teste de seu amor ainda estava por vir. Passou-se um ano desde aquela tarde na varanda, um ano de encontros cuidadosos, de construir algo real entre Valentina e Lorenzo. Eles foram devagar, jantares ocasionais, passeios no parque com Maitê, conversas longas até tarde da noite. Heitor permaneceu uma presença constante e surpreendentemente solidária.
Ele até encorajou discretamente o relacionamento, dizendo a Valentina que ela merecia ser feliz. Mas havia momentos. Valentina via nos olhos dele quando doía ver o irmão com a mulher que um dia foi dele. Era uma dinâmica complicada, delicada, que funcionava apenas porque todos os envolvidos estavam genuinamente tentando fazer o melhor possível.
E então veio o evento beneficente de aniversário da fundação. Era um jantar formal no mesmo hotel Unique, onde Lorenzo e Valentina haviam se beijado pela primeira vez. Valentina usava um vestido vermelho cereja. Seu cabelo solto, caindo em ondas pelos ombros. Lorenzo estava ao seu lado, lindo em um smoking preto, sorrindo orgulhosamente enquanto apresentava os sucessos do ano.
Heitor também estava presente, acompanhado de uma colega de trabalho. Não exatamente um encontro, ele havia esclarecido, mas um progresso. Valentina ficou genuinamente feliz por ele. A noite estava indo bem até que Lorenzo subiu ao palco para fazer seu discurso anual. Quero agradecer a todos por virem hoje à noite”, começou ele, a voz firme e clara. A Fundação Cavalcante alcançou marcos incríveis este ano.
Alfabetizamos mais de 5.000 crianças na zona leste, abrimos três novos centros comunitários e implementamos programas de mentoria que estão mudando vidas. Aplausos encheram o salão. Lorenzo esperou que diminuíssem antes de continuar. Mas esta noite eu não quero apenas falar sobre números e sucessos, quero falar sobre algo mais pessoal.
Seus olhos encontraram Valentina na multidão e ela sentiu seu coração acelerar sobre amor, sacrifício e ter a coragem de escolher a felicidade. O salão ficou silencioso. Valentina podia sentir todos os olhos se voltando para ela. “Há alguns anos eu conheci uma mulher”, continuou Lorenzo, nunca desviando o olhar dela. “Uma mulher que estava presa, infeliz, mas tentando ser corajosa.
E eu me apaixonei por ela profunda e completamente, mas ela estava casada com meu irmão. Um murmúrio percorreu a multidão. Valentina viu heitor na periferia de sua visão, imóvel observando. E por muito tempo mantivemos distância. Fizemos a coisa certa, ou pelo menos o que pensávamos ser a coisa certa. Mas o coração não obedece a lógica.
O coração não se importa com o que é apropriado ao conveniente. Lorenzo desceu do palco, caminhando lentamente em direção à mesa de Valentina. O coração apenas sabe o que quer. Ele parou diante dela, estendendo a mão. Valentina a pegou tremendo, deixando-o ajudá-la a se levantar. Valentina Ferreira”, disse ele, “a voz apenas para ela agora, embora o microfone ainda transmitisse suas palavras para todo o salão, você me ensinou que o amor vale qualquer sacrifício, que a felicidade não é egoísmo, que às vezes a coisa mais corajosa que podemos fazer é escolher
nós mesmos”. Lorenzo, ela mal conseguia respirar. O que você está fazendo? algo que deveria ter feito há muito tempo. E então, diante de todos, família, amigos, a sociedade paulistana, Lorenzo se ajoelhou. Eu te amo. Te amo com cada fibra do meu ser e eu quero passar o resto da minha vida provando isso para você.
Valentina, você se casa comigo? O silêncio que se seguiu foi absoluto. Valentina estava consciente de tudo. Os olhos de Lorenzo brilhando com esperança e vulnerabilidade. As centenas de pessoas observando Heitor imóvel em seu canto, Maitê, que tinha vindo com dona Célia, gritando Tio Lô alegremente, sem entender o momento. Eu Valentina olhou ao redor, sentindo o peso de todos aqueles olhares.
Lorenzo, você não podia ter esperado um momento privado? Não. Ele sorriu e havia determinação naquele sorriso. Porque eu escondi meu amor por você por tempo demais. Porque eu me envergonhei de sentir o que sinto. Porque o mundo precisa saber. Eu preciso saber que você não está mais presa. Que você é livre para escolher e eu estou pedindo na frente de todos para que você me escolha.
Valentina sentiu as lágrimas queimarem. Ela olhou para Eitor com medo do que veria em seu rosto, mas o que encontrou a surpreendeu. Não raiva ou dor, mas um pequeno aceno de encorajamento. “Seja feliz”, ele articulou silenciosamente. E naquele momento, Valentina percebeu a verdade. Ela não tinha que carregar culpa para sempre. Não tinha que se punir por ter seguido seu coração.
Heitor havia seguido em frente. “Ela também poderia?” Sim”, disse ela, as lágrimas finalmente caindo. “Sim, eu me caso com você”. Lorenzo se levantou de um salto, pegando-a em seus braços e girando-a. O salão explodiu em aplausos, alguns genuínos, outros educados, mas todos reconhecendo o momento extraordinário que tinha acabado de testemunhar. Quando Lorenzo finalmente a colocou no chão, ele a beijou.
Não um beijo tímido ou escondido, mas um beijo completo, apaixonado, que falava de anos de desejo contido e amor, finalmente livre para ser expresso. Quando se separaram, Valentina procurou o Heitor novamente. Ele estava saindo discretamente, mas antes de desaparecer pela porta, ele olhou para trás. Seus olhos encontraram-os dela e ele fez algo que a pegou completamente de surpresa.
Ele sorriu. Não era um sorriso triste ou amargo, era genuíno, caloroso, como se ele estivesse finalmente, verdadeiramente deixando ir. “Obrigado”, Valentina sussurrou, mesmo sabendo que ele não podia ouvir. Lorenzo seguiu seu olhar e viu o irmão desaparecendo. “Ele vai ficar bem”, disse ele suavemente, abraçando-a. “Nós todos vamos ficar bem.
” E enquanto Maitê corria para eles, gritando: “Mamãe, tio Lou, arriba!” E se jogando em seus braços, Valentina se permitiu finalmente, completamente acreditar nisso. Eles todos iam ficar bem. Seis meses depois, Valentina estava em pé na frente do espelho, ajustando o vestido branco simples que tinha escolhido para o casamento.
Era diferente do primeiro casamento, sem extravagâncias, sem centenas de convidados, sem falsidade, apenas família e amigos próximos no jardim da casa que ela e Lorenzo haviam comprado juntos. Não era a mansão dos Cavalcante. Era uma casa menor, mais acolhedora, em um bairro tranquilo, não muito longe, para que Maitê pudesse facilmente ver ambos os pais.
Tinha um jardim com um IP amarelo que Lorenzo havia plantado especialmente, dizendo que toda a casa nova precisava de raízes. Mamãe linda. Maitê agora com 2 anos e meio, girou em seu vestido de da minha cor de rosa. Eu linda também. Você é a coisa mais linda do mundo”, concordou Valentina, agachando-se para ajustar a tiara de flores na cabeça da filha.
Houve uma batida na porta. Dona Célia entrou, os olhos já brilhando com lágrimas. “Está na hora, querida.” Ela pegou as mãos de Valentina, apertando-as com força. “Você está pronta? Mais do que nunca estive.” Elas desceram juntas, Maitê pulando alegremente à frente. O jardim estava decorado com simplicidade elegante.
Luzes de fada penduradas nas árvores, cadeiras brancas organizadas em fileiras, flores do campo em cada assento. E no final do corredor improvisado, sob um arco coberto de flores, estava Lorenzo. Ele usava um terno azul marinho em vez de preto, sem gravata, o colarinho aberto, mostrando a pele bronzeada.
Quando a viu, seu rosto inteiro se iluminou e Valentina viu lágrimas brilharem em seus olhos. Mas o que mais tocou Valentina foi a pessoa parada ao lado de Lorenzo como padrinho Eitor. Ele estava ali sorrindo, genuinamente feliz por eles. Eles haviam conversado longamente antes. Valentina tinha perguntado se ele se importaria, se seria muito doloroso.
Eitor tinha segurado suas mãos e dito que não havia lugar que ele preferia estar, que ver seu irmão feliz, vê-la feliz, era tudo que ele queria. Valentina caminhou pelo corredor, cada passo a aproximando de seu futuro. Maite a seguia, jogando pétalas de rosas alegremente.
Quando chegou ao altar, Lorenzo estendeu a mão e ela a pegou, sentindo a familiaridade e a promessa naquele toque. “Olá”, disse ele suavemente. “Olá”, respondeu ela, sorrindo. A cerimônia foi curta e doce. Eles trocaram votos que haviam escrito: promessas de amor, parceria, crescimento. Prometeram ser pais para Maitê, parceiros um para o outro, melhores versões de si mesmos juntos.
Quando o juiz finalmente disse: “Pode beijar a noiva”. Lorenzo a puxou para seus braços e a beijou de uma forma que deixou claro para todos presentes que este era um amor real conquistado com dificuldade, mas que valera cada lágrima, cada sacrifício. A recepção foi uma celebração alegre.
Maitê dançou com Lorenzo, depois com Heitor, não fazendo distinção entre papai e tio papai, como ela começara a chamar Lorenzo. As pessoas riam, contavam histórias, brindavam ao novo casal. No final da noite, quando a maioria dos convidados já tinha ido, Valentina se encontrou na varanda com Heitor. Ele estava observando o jardim, uma cerveja esquecida na mão. “Obrigada por estar aqui”, disse ela suavemente.
“Significou muito para nós dois, eu não perderia”. Heitor se virou para olhá-la e havia paz em seus olhos. Você sabe, eu pensei que seria mais difícil, mas vendo vocês dois ali tão obviamente felizes, tudo que consegui sentir foi alívio.
Alívio? De que você encontrou o que estava procurando? Que meu irmão encontrou alguém que o ama completamente? Ele sorriu. E que Maitê vai crescer vendo que tipo de amor vale a pena esperar? E você? Perguntou Valentina. Você está feliz? Estou chegando lá. Heitor tomou um gole da cerveja. Estou namorando. Na verdade, aquela colega de trabalho é novo, mas é bom, simples, sem complicações. Eu fico feliz por você. Eu sei que fica.
Eitora a puxou para um abraço breve, mas sincero. Seja feliz, Valentina. Você e Lorenzo, vocês merecem. Quando ele se afastou, Lorenzo estava parado na porta, observando com uma expressão suave. “Obrigado, irmão”, disse ele quando Heitor passou. Por entender, por perdoar. Não há nada a perdoar. Eitor apertou o ombro de Lorenzo.
Amor não é algo que podemos controlar. Só podemos escolher o que fazer com ele. E vocês escolheram bem. Os dois irmãos se abraçaram e Valentina viu anos de tensão e dor finalmente serem liberados. Não seria fácil. Relações familiares nunca são após algo assim. Mas eles estavam tentando. E às vezes a tentativa é tudo que importa.
Quando Heitor finalmente partiu, Lorenzo se juntou à Valentina na varanda. Ele a envolveu por trás, descansando o queixo em seu ombro. “Então, senhora cavalcante”, murmurou ele em seu ouvido. “Como você se sente?” “Como se tivesse finalmente chegado em casa,”, respondeu ela, virando-se em seus braços para encará-lo depois de uma jornada muito longa. Valeu a pena a jornada? Valentina pensou em tudo que tinha passado.
O casamento vazio, a gravidez assustadora, os sentimentos proibidos, a culpa, a dor, a eventual liberdade, cada momento de dificuldade, cada lágrima derramada, cada escolha impossível. “Sim”, disse ela finalmente. “Valeu a pena porque me trouxe aqui com você”. Lorenzo a beijou doce e profundo.
Uma promessa de todos os amanhãs que estavam por vir lá dentro. Eles podiam ouvir Maitê rindo, dona Célia cantando suavemente, os últimos convidados se despedindo, vida continuando, simples e preciosa. E enquanto o IP amarelo derramava suas pétalas douradas sobre eles como bênçãos, Valentina se permitiu acreditar completamente, pela primeira vez em sua vida, que ela merecia essa felicidade, que não era egoísta escolher o amor, que fins felizes eram possíveis, mesmo depois dos começos mais difíceis. Não era o fim da história, era apenas o começo de um novo capítulo, um onde ela
era livre, amada e, finalmente, verdadeiramente feliz. É isso, pensou ela, pressionando-se mais contra Lorenzo enquanto as estrelas começavam a aparecer no céu paulistano. Isso era tudo que ela sempre quis. M.