Prepare-se. Está prestes a embarcar numa viagem que o fará rir, chorar e acreditar que a vida reserva surpresas maravilhosas para aqueles que ousam mudar. O despertador toca às 5h45, como todos os dias nos últimos 10 anos. Robson estende a mão mecanicamente para desligar o alarme estridente sem abrir os olhos.
A cama king-size com os seus lençóis de algodão egípcio de mil fios está cuidadosamente dobrada no lado que ele nunca usa, nunca usa. Aos 34 anos, Robson Cavalcante tem tudo aquilo que a sociedade define como sucesso. O seu apartamento de cobertura a sul de Porto Alegre tem uma vista espetacular para o Rio Guaíba, sobretudo ao amanhecer, quando os primeiros raios de sol tingem a água de dourado e laranja, mas nunca parou para a admirar.

Não há tempo. Acorda com a precisão de um soldado, seguindo uma rotina tão enraizada na sua mente como um software: banho de 12 minutos, barba bem aparada, fato Armani cinzento-escuro, um dos 15 que possui, todos quase idênticos: gravata azul-marinho, botões de punho prateados, um relógio suíço que custa mais do que muitas pessoas ganham num ano.
Enquanto a moderna máquina de expressos italiana prepara o café, Robson segura o seu tablet, verificando os e-mails que recebeu nas poucas horas de sono. 37 mensagens, 14 delas marcadas como urgentes. Ele suspira. Um som que nunca ninguém ouviu. Uma expressão silenciosa de fadiga que vai para além do físico.
O café é sempre amargo, mas forte, e é disso que precisa: força, energia, combustível para um dia interminável de reuniões. Decisões que envolvem milhões de pessoas, problemas que nunca mais acabam. Às 6h40, estava no elevador privado, descendo diretamente para a garagem. O seu Mercedes-Benz preto aguardava-o. Brilhante e imponente.
Entrou no lugar do condutor e conduziu pelo ainda escasso trânsito de Porto Alegre em direção ao seu escritório no bairro de Moinhos de Vento. O rádio estava sintonizado em notícias económicas. Bolsa, dólares, taxas de juro, números, sempre a mesma coisa. No interior, o escritório era um espaço frio e minimalista, todo em vidro, aço e betão, moderno, eficiente, desprovido de calor humano. A sua secretária, Carla, estava lá, como sempre.
Era competente, pontual e completamente profissional. Bom dia, Sr. Cavalcante. O relatório trimestral está em cima da sua secretária. A reunião com os investidores japoneses tinha sido reagendada para as 10h, e foi a essa hora que Patricia retornou a chamada. Robson estremeceu ligeiramente ao ouvir o nome de Patrícia, mais uma numa longa lista de relações que começaram promissoras, mas acabaram em vazio. Era bonita, sofisticada e bem relacionada.
Era exatamente o tipo de mulher com quem as pessoas esperavam que ele namorasse. Mas, ao fim de três meses, sabia como esta história iria terminar, como todas as outras. “Diz-lhes que estou numa reunião”, respondeu sem olhar para Carla. As horas foram passando, reunião após reunião, contacto após contacto, contratos, negociações, conflitos, resoluções e, depois, mais problemas. Um ciclo interminável que o deixava exausto, mas nunca satisfeito.
Nessa tarde, almoçou sozinho no seu escritório. Salada de frango com quinoa, preparada por um sofisticado serviço de entregas. A comida era insípida e saudável, que ele engoliu mecanicamente enquanto os seus olhos percorriam folhas de cálculo e previsões. Nem se deu ao trabalho de usar um prato. Comeu diretamente da embalagem, poupando dois minutos para se servir.
Nessa tarde, durante uma videoconferência com um cliente da Europa, Robson sentiu algo estranho, uma sensação que não conseguiu identificar. Era como se uma voz sussurrasse no fundo da sua mente. Será isso? Será isso? Piscou os olhos, tentando concentrar-se no que o executivo francês dizia sobre a expansão do mercado, mas a sensação persistia — uma inquietação, um vazio.
Quando o seu turno finalmente terminou, dez horas depois de ter começado, voltou para a sua cobertura. Estava demasiado silencioso. Ligou a televisão e ouviu apenas um zumbido fraco. Estava sentada no sofá de pele italiano, olhando fixamente para algo. O seu telemóvel tocou. Era novamente a Patrícia. Queria jantar, ir àquele restaurante novo que todos comentavam, vê-lo ao seu lado.
Robson digitou uma resposta educada, mas firme, terminando a relação antes mesmo de esta começar. Era injusto para ela continuar algo que ele sabia que nunca iria resultar. Levantou-se e caminhou até à janela. Lá em baixo, a cidade estava iluminada por milhares de luzes. Tinha de admitir que Porto Alegre era bela à noite, mas era uma beleza distante, inacessível, como tudo na sua vida. Robson tinha construído um império: cinco empresas de sucesso em diversos ramos, investimentos que lhe rendiam mais dinheiro do que alguma vez poderia gastar, imóveis, automóveis, artigos de luxo.
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